São Paulo, sexta-feira, 12 de maio de 2006

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GUERRA SEM LIMITES

Informações são fornecidas pelas três maiores operadoras do país; Bush diz que governo agiu dentro da lei

EUA monitoram telefonemas de milhões

Paul J. Richards-25.jan.2006/France Presse
John Negroponte, chefe de inteligência dos EUA, caminha pela Agência de Segurança Nacional


SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

A Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA) armazena secretamente os dados de bilhões de telefonemas feitos por dezenas de milhões de americanos desde os dias seguintes a 11 de setembro de 2001, sem a autorização destes.
As informações são fornecidas pelas empresas AT&T, BellSouth e Verizon, as três maiores operadoras do país, que atendem 200 milhões de pessoas, ou dois terços da população americana, sem que ordens judiciais tenham sido emitidas para tanto, como exige a lei e defendem entidades de direitos civis. Pior: as teles recebem pelas informações fornecidas.
O programa, classificado de "o maior arquivo desse tipo no mundo", cujo objetivo seria ter registradas todas as ligações feitas em território americano, grava apenas os números de quem faz e recebe os telefonemas, sejam domésticos ou internacionais, mas não seus conteúdos. A idéia, segundo fontes da NSA, é detectar padrões ou traçar perfis de pessoas que possam ser ou desenvolver atividades terroristas, mesmo que a grande maioria dos investigados não seja suspeita.
A informação foi publicada pelo jornal "USA Today" em sua edição de ontem. Procurado pela Folha, Don Weber, porta-voz da agência, não negou nem confirmou o relato. "Dada a natureza do trabalho que realizamos, seria uma irresponsabilidade fazer comentários sobre questões operacionais, verdadeiras ou não, portanto não tenho mais informações a dar", disse ele. "É importante ressaltar, no entanto, que a NSA leva a sério suas responsabilidades legais e opera sob a lei."
Numa entrevista ontem à tarde chamada de "intempestiva" pelos presentes, o presidente George W. Bush negou que o governo ouça ligações domésticas sem aprovação judicial e manteve que "a privacidade de americanos comuns é fortemente protegida em todas nossas atividades". "Nossos esforços são focados em ligações com a Al Qaeda e seus afiliados", disse o presidente, para depois deixar a sala, sem ouvir perguntas dos jornalistas.
A AT&T afirmou: "Nós respeitamos a confiança dos consumidores em nosso trabalho. Se e quando a AT&T é chamada a colaborar com o governo, nós os fazemos apenas sob o domínio da lei". O teor das respostas da BellSouth e da Verizon foi o mesmo.

"Ilegal e absurdo"
Segundo relata o periódico, logo após o 11 de Setembro, AT&T, BellSouth, Verizon e Qwest foram procuradas pela agência, que queria fechar um acordo de acesso às informações. As três primeiras teriam aceito; a Qwest exigiu que a NSA tivesse o programa aprovado pelo Tribunal Especial estabelecido pelo Ato de Vigilância de Inteligência Estrangeira (FISA), que desde 1978 prevê um foro para esses tipos de caso.
Diante das negativas da agência, a tele, a menor das quatro, que atende 14 milhões de assinantes em 14 Estados, pediu então uma autorização por escrito do equivalente americano da Procuradoria Geral do Ministério Público, que nunca veio.
"Isso não só é ilegal como um absurdo", disse à Folha Ken Gude, diretor associado do Center for American Progress.
Suspeitas de violação de direitos civis em nome da "guerra ao terror" por parte da agência doméstica sob George W. Bush são comuns. A NSA já foi acusada de escuta telefônica de ligações internacionais e violação de correspondência eletrônica sem mandato judicial e é ré de um processo de uma escuta clandestina doméstica. Mas essa é a primeira vez que fontes confirmam um programa todo destinado a isso.
Em dezembro passado, Bush disse ter autorizado diretamente a interceptação sem mandado judicial de telefonemas e e-mails internacionais, desde que "uma das pontas" da comunicação, como disse então o presidente, fosse em território estrangeiro.
O general Michael Hayden, indicado por Bush para dirigir a CIA, chefiou a NSA de março de 1999 a abril de 2005. Criada em 1952, a agência tem como objetivo proteger os EUA de ataques externos. Sua existência foi negada por tanto tempo que se dizia que NSA significava "No Such Agency" (agência que não existe).
A revelação de ontem pode complicar a aprovação de Hayden pelo Congresso.


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