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Chile debate lei para tirar verba do cobre de militares
Projeto enviado por Bachelet ao Congresso nesta semana conta com apoio da oposição
Herança da era Pinochet, lei que governo deseja revogar permitiu ao Chile ser o país que mais gastou com armas na região entre 2000 e 2008
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
A presidente chilena, Michelle Bachelet, enviou ao Congresso nesta semana projeto
para revogar a Lei do Cobre,
que destina às Forças Armadas
10% do dinheiro das vendas do
metal, principal produto de exportação chileno. O dinheiro
era usado exclusivamente para
a compra de armas.
A revogação da lei vinha sendo negociada por Bachelet havia dois anos. Ela deve ser aprovada até as eleições presidenciais de 11 dezembro, já que há
apoio da maioria das forças políticas, incluindo a direita.
O fim da Lei do Cobre e a sua
substituição por normas que
submetem todo o orçamento
da área ao controle civil deverão provocar a redução dos gastos militares do país. Em relação ao PIB (3,4%, em 2007) e à
população (US$ 281,06 per capita), eles são hoje os maiores
da América do Sul.
Com 17 milhões de habitantes -menos do que a Grande
São Paulo-, o Chile foi o país da
região que mais gastou com armamentos entre 2000 e 2008,
segundo o Sipri (Instituto Internacional de Estudos da Paz
de Estocolmo), que mantém
banco de dados sobre o tema.
As contas do Sipri não incluem ainda as compras da
França recém-anunciadas pelo
Brasil, mas levam em conta boa
parte dos gastos da Venezuela
entre 2006 e 2008 com armas
compradas da Rússia.
Bachelet é a quarta presidente eleita desde 1989 pela Concertação, coalizão do Partido
Socialista com a Democracia
Cristã. Internamente, sua medida significa o último passo
importante na abolição de leis
herdadas da ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1989). Ontem foi o 36º aniversário do golpe militar.
A Lei do Cobre original, de
1958, destinava 15% dos lucros
das mineradoras a um fundo
para equipar as Forças Armadas. Mas ela foi reformulada na
ditadura para estabelecer o
percentual sobre as vendas e
um piso mínimo, equivalente a
US$ 240 milhões.
"O projeto [do governo] normaliza o Chile nesse aspecto, o
transforma num país democrático normal", disse à Folha o
analista chileno Raúl Söhr, especialista em temas militares.
Externamente, a lei deverá
ter reflexos, segundo Söhr, na
relação com o Peru, com quem
o Chile tem uma antiga disputa
sobre limites marítimos, em
exame pela Corte Internacional de Justiça, em Haia (Holanda). Sem chegar ao nível chileno de gastos, o Peru vinha aumentando suas compras bélicas desde 2006.
"Os temores peruanos são
compreensíveis. As compras de
armas foram excessivas em relação às necessidades de segurança do Chile", disse Söhr.
Ao firmar o projeto enviado
ao Congresso, numa cerimônia
da qual participaram os chefes
militares, Bachelet ressaltou
que o fim da Lei do Cobre aumentará a competitividade da
Codelco, única estatal importante que não foi privatizada
durante a ditadura.
Como a "taxa" para a compra
de armas era sobre as vendas, a
empresa entregava aos militares cerca da metade do valor
que destinava ao Fisco. Com a
alta do cobre nos últimos anos,
isso rendeu em média US$ 1 bilhão, pouco menos de um quarto do orçamento militar chileno no ano passado.
O esperado fim da Lei do Cobre deve ser o último ato importante do governo Bachelet.
Mesmo o candidato da direita a
sua sucessão, Sebastián Piñera,
que hoje lidera as pesquisas,
apoia o projeto.
Financiamento futuro
O esperado fim da Lei do Cobre não significa que os militares chilenos vão ficar a pão e
água. A proposta de legislação
substituta encaminhada pelo
governo ao Congresso prevê
que o Ministério da Defesa
coordenará o planejamento para o "desenvolvimento das capacidades estratégicas da defesa" (isto é, novos armamentos),
levando em conta períodos de
12 anos e orçamento para cada
quatro anos.
Esse orçamento será aprovado pelo presidente, e, a cada
ano, a parte correspondente será liberada junto com o Orçamento geral do Estado.
O projeto também prevê a
criação de um fundo de contingência para gastos excepcionais, administrado pelo Ministério da Fazenda.
Em termos institucionais, a
maior novidade é que as despesas serão submetidas ao crivo
de autoridades eleitas, enquanto os fundos da Lei do Cobre
eram controlados pelos militares. Mas os dados sobre "investimentos em defesa" manejados pelo governo e o Congresso
terão caráter "reservado".
De acordo com a imprensa
chilena, duas reivindicações
dos comandantes militares não
foram atendidas: a de que houvesse um piso mínimo para os
orçamentos e a de que a parcela
anual fosse reajustada por um
indicador fixo, como a variação
do PIB.
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