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Pleito sob golpistas é "pôr lobo para cuidar de ovelhas", diz hondurenho
DA ENVIADA A HONDURAS
Para o diretor da Universidade Autônoma de Honduras, Ramón Romero, a resistência ao
golpe de Estado não é um movimento em defesa do presidente
deposto Manuel Zelaya, mas
uma luta pela retomada da democracia no país. Romero, que
lança nas próximas semana um
livro sobre o golpe de 28 de junho, afirma que muitos países
no mundo estão esperando o
desfecho da crise e a posição
dos EUA. "Em Honduras, Obama está mandando uma mensagem ao mundo", diz.
(AF)
FOLHA - Como é a relação de Honduras com os EUA?
RAMÓN ROMERO - A dependência econômica trouxe dependência política. Os americanos
se converteram em uma força
decisiva em Honduras. A manifestação política e militar mais
importante disso foi durante a
década de 1980, quando a crise
centro-americana instalou a
revolução nicaraguense e insurreições em El Salvador e
Guatemala. Honduras teve papel importante dentro da estratégia dos EUA para vencer os
golpes revolucionários. O território de Honduras era uma plataforma dos EUA.
FOLHA - O que mudou agora, já
que o governo golpista segue apesar da discordância dos EUA?
ROMERO - A mudança é a chegada do presidente Obama à
Casa Branca. Os EUA, pela primeira vez, estão propondo relações menos verticais. A evidência mais importante é que os
EUA não apoiam o golpe. Mas,
em sua atuação em Honduras,
Obama está mandando uma
mensagem ao mundo. Há países vivendo crises políticas, como Bolívia, Equador e Argentina. Neles, setores estão na expectativa do resultado e da posição americana aqui. Se os
EUA permitirem o golpe,
abrem espaço a aventuras golpistas em outros países.
FOLHA - O sr. diz que a resistência
ao golpe está crescendo. Onde estão
os descontentes?
ROMERO - É tão forte que o governo teve que tomar medidas
radicais, como suprimir as liberdades civis. Mas a resistência assumiu duas atitudes: esperar e ver o que sai da possibilidade de diálogo, porque acreditamos nele, e não em tirar
pessoas de suas casas para serem massacradas.
FOLHA - A reação ao golpe não é
necessariamente a favor de Zelaya?
ROMERO - A reação muito forte
é contra o golpe, de setores diferentes, por razões diferentes.
O governo Micheletti desenvolveu uma estratégia de propaganda para desqualificar a
resistência. Dizem que são poucas pessoas, que são seguidores
de Zelaya, e nem todos são.
A resistência reage contra o
golpe, não apenas em favor de
Zelaya. Querem de volta a democracia. As pessoas não querem ter suas liberdades restringidas. Zelaya não foi um ótimo
presidente, houve falhas políticas, econômicas e sociais, evidências de corrupção. Não se
trata de termos passado de um
grande presidente para um medíocre. O problema é que se rasgou o processo de construção
democrática.
FOLHA - As eleições podem restabelecer esse processo?
ROMERO - Como pode haver
eleições quando os cidadãos
não têm direitos cidadãos,
quando os meios de comunicação são fechados e reprimidos,
quando as pessoas que se expressam contra o governo são
objeto de repressão? A condição básica para que haja democracia é que exista liberdade.
Não temos liberdade.
É muito provável que nesse
processo eleitoral haja fraude.
A comunidade internacional
não virá supervisionar, grande
parte da sociedade civil não terá espaço. Além disso, a cidadania está em boa parte pensando
em não votar.
Como um governo ilegítimo
vai conduzir eleições legítimas? Como as Forças Armadas,
que há três meses derrubaram
um presidente, vão garantir as
eleições? É como pôr um lobo
para cuidar das ovelhas.
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