São Paulo, quinta-feira, 12 de dezembro de 2002

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AMÉRICA LATINA

Diante de uma eventual guerra contra o Iraque, Venezuela é crucial para garantir fornecimento do produto

EUA temem perder petróleo venezuelano

OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO

O governo Bush está muito preocupado com o envolvimento do setor petroleiro venezuelano na greve geral porque, diante da possibilidade de uma guerra contra o Iraque, os EUA precisam de fornecimento estável de petróleo.
Cerca de 15% do petróleo importado pelos EUA vem da Venezuela, quinto exportador mundial do produto. Com a entrada em greve da PDVSA (estatal de petróleo), a exportação foi afetada.
Apesar de preocupados, os EUA estão praticamente de mãos amarradas devido à sua falta de credibilidade para dialogar com o presidente Hugo Chávez -em abril, quando houve uma tentativa de golpe contra o presidente, os EUA apressaram-se em apoiar os golpistas- e à ausência de funcionários de alto nível em Washington para lidar com o país.
Eis um resumo do dilema vivido pelos EUA diante do aprofundamento da crise, segundo Erick Langer, diretor do programa sobre a Venezuela do Centro de América Latina da Universidade Georgetown, em Washington.
"Os EUA optaram por ignorar Chávez enquanto o petróleo continuasse fluindo. Mas agora a Venezuela torna-se uma das questões mais cruciais para o governo Bush", afirmou Langer, 38, em entrevista por telefone à Folha.

Folha - Como a atual crise na Venezuela está sendo vista nos EUA?
Erick Langer -
Parece que, com o o envolvimento da PDVSA, a greve chegou a um ponto sem retorno. Há uma guerra total entre a oposição e o governo, e o resultado, creio, dependerá de quem conseguir resistir por mais tempo. Ou a paralisação fracassa ou Chávez terá de partir. Se fracassar, isso significará que Chávez assumirá o controle da PDVSA, que até agora havia conseguido manter sua independência. Embora estatal, a empresa tem sido administrada de forma profissional, com base em critérios econômicos e comerciais, não políticos. Se isso mudar, a produção de petróleo irá ladeira abaixo.

Folha - Como isso atinge os EUA?
Langer -
O governo está preocupado porque gostaria de invadir o Iraque, mas necessita de um suprimento estável de petróleo. A relação entre os governos Bush e Chávez sempre foram difíceis. Otto Reich -que foi indicado para o cargo de subsecretário de Estado para Assuntos Latino-Americanos, mas acaba de abandoná-lo porque não obteve aprovação do Congresso - é um cubano-americano muito próximo ao movimento contra Fidel Castro [ditador cubano" nos EUA. Como Chávez sempre se posicionou como aliado de Fidel, você imagina a visão que o governo tem sobre ele. Além disso, ele sempre teve um discurso antiamericano. Entretanto, os EUA nunca fizeram grande coisa porque o importante era que o petróleo venezuelano continuasse a chegar. Agora, isso está ameaçado. E, até onde eu saiba, não há ninguém em posição de liderança no governo para lidar com a questão.

Folha - Essa ausência de estratégia para a Venezuela pode ser estendida à América Latina em geral?
Langer -
Após os atentados de 11 de setembro, a prioridade nos EUA mudou das questões econômicas e diplomáticas para as questões militares e de segurança. E a América Latina é praticamente irrelevante para os EUA do ponto de vista de segurança. Assim, a região saiu da agenda, e houve um abandono das questões econômicas que são tão importantes para a região. É o caso da Argentina, que enfrenta grave crise sem receber qualquer ajuda dos EUA. Nesse sentido, a visita do presidente eleito do Brasil a Bush foi importante. Lula pode ser o porta-voz de outros líderes da região e alertar o governo de que ele precisa prestar atenção aos problemas econômicos da América Latina. Do contrário, eles poderão se transformar em sérios problemas políticos.


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