São Paulo, sábado, 13 de fevereiro de 2010

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Brasil fará crítica a direitos humanos no Irã

Mudança de tom no conselho sobre o tema, em Genebra, é planejada como demonstração de que apoio a Teerã não é incondicional

Ao endurecer discurso na esfera humanitária, país busca estender margem de atuação para manter posição contra as sanções no CS


LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

O Brasil está coordenando sua posição sobre eventuais sanções ao Irã no Conselho de Segurança da ONU, em Nova York, com sua ação sobre o país no Conselho de Direitos Humanos da organização, em Genebra. Um endurecimento neste último o ajudaria a se credenciar como mediador na questão nuclear.
Fontes ouvidas pela Folha relatam uma triangulação constante que inclui conversas e reuniões abarcando ambos os temas à medida que cresce a pressão por novas sanções contra Teerã -o Irã passou a enriquecer urânio a um nível mais alto nesta semana, ampliando seu programa nuclear, que diz ser pacífico, mas que para EUA e aliados visa a bomba.
É nesse contexto que se aproxima a revisão periódica da situação dos direitos humanos no Irã pelo conselho em Genebra, depois de amanhã.
A ideia do Itamaraty é tomar uma posição mais firme em relação à violação de direitos humanos no Irã ao passo que mantém o discurso contra sanções no CS -onde defende haver espaço ainda para diálogo.
Brasília estreitou os laços com Teerã e tem recebido críticas abertas e veladas, vindas dos demais países que antes tentavam negociar com o governo iraniano o escrutínio de seu programa nuclear e que agora pedem sanções (EUA, França e, a julgar pela última semana, também a Rússia).
Com a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva agendada para maio, é preciso marcar posição. Uma ação mais firme no Conselho de Direitos de Humanos mostraria aos demais aliados que o Brasil não é aliado irrestrito do Irã, dando mais credibilidade à sua insistência pelo diálogo nuclear.
No mês passado, o chanceler Celso Amorim declarou que as questões não devem ser "misturadas". É uma brecha para rever o histórico de evitar críticas duras ao país e se abster nas votações sobre o tema na Assembleia Geral da ONU.
Outro passo nessa direção é o discurso que a embaixadora brasileira nas Nações Unidas em Genebra, Maria Nazareth Azevedo, fará durante a sessão de revisão do Irã, depois de amanhã. A fala, apurou a Folha, deve citar as prisões arbitrárias e condenações sumárias à morte no país. Mesmo sem mencionar a repressão pós-eleitoral (a mesma que Lula chamou de "briga de torcida"), cujo saldo foi de ao menos 20 mortos e centenas de ativistas presos, a alusão é clara.
Mais de um observador ouvido pela reportagem aponta uma mudança recente, discreta mas firme, na posição brasileira. O Itamaraty também passou a considerar "mais razoável" a posição americana sobre o tema (os EUA são críticos firmes das violações).
O Brasil já havia colocado, em outras ocasiões, sua preocupação com a perseguição de minorias e com os direitos das mulheres no país -inclusive o fez no encontro de Lula com Mahmoud Ahmadinejad em Brasília, em novembro. Desde então, o tema continua sendo discutido "a nível de embaixadas", segundo o Itamaraty.
A referência às prisões, porém, foi feita apenas na última reunião da ONU em Nova York sobre a questão, em dezembro. Foi exatamente quando o país se absteve de votar alegando que o conselho em Genebra seria o fórum adequado.
Entidades de direitos humanos pressionam agora pelo cumprimento da promessa e, como pediu a Conectas em carta dirigida a Amorim, "recomendações concretas e mensuráveis ao Estado iraniano".


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