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Crescimento faz angolanos retornarem
Início de recuperação econômica e cinco anos de paz levam de volta ao país africano cidadãos que estavam refugiados
Guerra civil de 27 anos, encerrada há cinco, deixou 1 milhão de mortos, destruiu infra-estrutura e afetou ecossistema de Angola
ADRIANA MARCOLINI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Godwin Malichi é um dos 410
mil angolanos que voltaram para casa nos últimos quatro anos
com o apoio da ONU. O número
equivale a 90% de todos os que
deixaram o país: 457 mil. Depois de se ver obrigado a morar
31 anos num campo de refugiados na vizinha Zâmbia, sua
vontade de voltar era enorme.
E a expectativa também.
Transcorridos cinco anos
desde o fim da guerra civil, celebrados neste último mês de
abril, o economista Malichi esperava achar trabalho e matricular os filhos numa escola. No
entanto, apesar de a economia
angolana estar se recuperando,
ele tem encontrado exigências
burocráticas que não esperava
-entre as quais a necessidade
de carteira de filiação ao MPLA
(Movimento Popular de Libertação de Angola), partido atualmente no poder, para conseguir emprego nas instituições
públicas.
Uma herança dos 27 longos
anos de um conflito que deixou
1 milhão de mortos, uma estimativa de 12 milhões de minas
terrestres e cerca de 100 mil
pessoas mutiladas, além de ter
trazido prejuízos ao ambiente e
arrasado a infra-estrutura do
país -que já havia sido devastado pelos 14 anos da guerra pela
independência contra Portugal
(1961-1975).
"Volto em maio", afirma Alexandre João de Carvalho, refugiado angolano no Brasil, que
aqui se especializou em informática. Vivendo no Rio de Janeiro desde 1993, ele será um
dos primeiros, entre os 1.750
angolanos que foram acolhidos
pelo país, a aceitar o apoio oferecido pelas Nações Unidas aos
que desejam regressar voluntariamente.
"Vamos pagar o bilhete aéreo
e daremos uma ajuda individual de US$ 200 para as despesas de viagem", conta o representante do Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados) no Brasil,
Luis Varese. Em Angola, o Acnur desenvolve vários programas de apoio para os que voltam, procurando viabilizar a
sua permanência.
Crescimento
O país que Carvalho encontrará será bem diferente daquele que deixou em 1993. Os
bombardeios e explosões cederam lugar à retomada da economia. Responsável por 50% do
PIB, a produção de petróleo já
ocupa o segundo lugar na África e a exportação de diamantes
é a segunda maior fonte de divisas. O PIB tem crescido em média 9% ao ano, e a inflação anual
está por volta de 10%.
Apesar de exibir índices positivos, Angola carece de atividades econômicas expressivas fora desses setores e sofre de corrupção crônica. A má distribuição de renda talvez seja o maior
obstáculo ao desenvolvimento:
70% dos angolanos vivem com
menos de US$ 2 por dia, de
acordo com o Banco Mundial.
O saneamento inadequado
tem causado problemas graves
de saúde pública, como a recente epidemia de cólera. Os dados
são alarmantes: segundo a organização Médicos sem Fronteiras, desde o início deste ano,
63 pessoas já morreram de cólera e foram notificados cerca
de 4.800 casos.
O secretário Daniel Nogueira
Leitão, diplomata da embaixada brasileira em Luanda, capital angolana, observa que, embora o governo de Angola tenha
muitos desafios pela frente, o
país tem conseguido crédito financeiro internacional e está
investindo na recuperação da
infra-estrutura. "O Brasil ampliou em US$ 750 milhões a linha de crédito a Angola e está
aumentando o apoio na área de
cooperação técnica", conta.
O diplomata afirma que os
angolanos confiam na retomada do processo democrático e
salienta que o cadastramento
dos eleitores, ora em curso, é
um passo importante.
O governo do presidente José Eduardo dos Santos, do
MPLA, fixou as eleições parlamentares para 2008 e as presidenciais para 2009 -a primeira vez que os angolanos vão votar desde 1992.
As eleições serão um teste
para a paz e a democracia e uma
ocasião para colocar à prova a
frase do escritor angolano José
Eduardo Agualusa: "O pessimismo é um luxo dos povos felizes".
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