São Paulo, domingo, 13 de julho de 2008

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Europa precisa de fronteira controlada, diz somali-holandesa

Para ativista nascida na Somália, bloco deve deixar entrar os imigrantes necessários, não "selecionar os mais miseráveis"

Ex-deputada cuja biografia é best-seller mundial defende imigração seletiva e conta por que mentiu ao pedir asilo na Holanda

CLARA FAGUNDES
DA REDAÇÃO

Ativista feminista e uma das mais célebres críticas do islã, Ayaan Hirsi Ali acostumou-se a controvérsias desde que desapareceu no caminho entre o Quênia e um casamento arranjado com um primo no Canadá, aos 22 anos. Um filme, um diploma, três livros e um mandato depois da chegada, diz que a Europa não deve deixar entrar multidões de miseráveis. Jurada de morte por radicais islâmicos, a pesquisadora do conservador American Enterprise Institute, que veio ao Brasil há duas semanas para participar dos seminários Fronteiras do Pensamento Copesul-Brasken, em Porto Alegre e Salvador, diz ter sorte: pode falar o que pensa. Não evita assuntos embaraçosos, como as mentiras que lhe renderam asilo e liberdade na Holanda -e mais tarde custariam seu mandato pelo Partido Liberal. Como é a vida sob escolta permanente? "Assim", sorri, olhando em volta. Na sala do hotel paulistano onde Ali recebeu a Folha, sete pessoas -três agentes da Polícia Federal brasileira- a escoltavam durante a entrevista. "É assim, 24 horas por dia". Desculpa-se: sobre isso não pode falar mais.

 

FOLHA - Os assassinatos de Theo Van Gogh e Pim Fortuyn [político de direita, morto em 2002] chocaram a Holanda. Como isso afetou a política em relação aos imigrantes?
AYAAN HIRSI ALI
- A Holanda já vinha mudando desde 1999, quando começaram a ser propostas políticas para lidar com os imigrantes muçulmanos.
Mas havia um tabu politicamente correto em relação à sociedade multicultural, ao islã e os muçulmanos. A morte de Fortuyn inflamou os debates.
O que mudou desde 2003, quando entrei para o Parlamento, é que há uma atenção maior sobre a posição das mulheres e debates abertos sobre a influência do islã na integração dos imigrantes. Desde novembro, porém, o novo governo [coalização centrista liderada pelos democratas-cristãos] está retomando o paradigma do politicamente correto.

FOLHA - A "Diretiva de Retorno" aprovada pelo Parlamento Europeu é considerada excessivamente dura por países latino-americanos. A Europa precisa de regras mais rígidas quanto a imigração e asilo?
ALI
- Não, a Europa precisa é de um sistema comum de imigração, como nos EUA. A União Européia tem 26 países, cada um com um sistema. Ainda não fizemos uma escolha sobre que imigrantes devemos deixar entrar. Os EUA selecionam os imigrantes com base nas necessidades do país. A Europa escolhe os que são mais miseráveis.
Eu acredito que isso é o que tem de mudar.

FOLHA - Você conquistou mais do que a maioria dos imigrantes e refugiados. Suas conquistas são parcialmente resultado da generosidade que encontrou na Holanda?
ALI
- A Holanda foi fundamental para minhas conquistas pessoais... Encontrei pessoas muito generosas, livres, que me acolheram e me guiaram. Eu freqüentei uma universidade gratuita, consegui um trabalho rapidamente como tradutora paga pelo governo.

FOLHA - Em situações como as que levaram à sua fuga para a Holanda é justificável que migrantes desesperados mintam para autoridades?
ALI
- Seria ridículo dizer que não é justificável, depois de ter feito isso. Na época, eu me senti envergonhada, mas de algum modo julguei válido mentir. Inventei uma história que se adequasse às exigências. Se tivesse dito que estava fugindo de um casamento arranjado, não teria conseguido asilo.


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