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Morales deve focar em diálogo com Congresso
DA ENVIADA A LA PAZ
No referendo de domingo na
Bolívia governadores autonomistas mantiveram seus cargos, e permaneceu a queda-de-braço entre os pólos. Mas o presidente Evo Morales sai da votação com um trunfo: a ampla
vitória -66,3% com 80% da
apuração concluída- e sua votação expressiva no rico leste
do país impedem seus adversários de questioná-lo como líder
nacional, com autoridade sobre
todo o território.
Não é pouco. O número dá a
Morales argumentos contra os
grupos radicais -aliados dos
governadores- que o impediram de visitar regiões opositoras e receber os colegas Hugo
Chávez (Venezuela) e Cristina
Kirchner (Argentina) na semana passada. Os episódios levaram ao confinamento do presidente nas terras altas, aos gritos de que ele só governava parte do país, numa das cenas mais
simbólicas da crise política.
A votação mostrou que o país
está dividido entre a meia-lua
(o bloco de quatro departamentos autonomistas) e o altiplano governista. Porém, o território governado pelos adversários mais ferrenhos do presidente tampouco rejeita categoricamente Morales. O presidente ganhou em Pando (52%),
empatou em Tarija e alcançou
cifras em torno de 40% em Beni e em Santa Cruz, o rico departamento cujo governador,
Ruben Costas, lidera a oposição
a Morales. Os quatro governadores opositores foram também amplamente ratificados. O
cruzamento dos números indica que pelo menos parte dos
eleitores ignorou o conflito nacional e votou tanto por Morales quanto por seus mais ferrenhos opositores.
O referendo mostrou ainda
que, paradoxalmente, o presidente é fator de divisão mas
também de unidade, num país
que teve cinco presidentes desde 2001 -Morales, há mais de
dois anos no cargo, superou a
maioria dos seus antecessores.
Congresso em foco
Mas, se a leitura dos resultados impõe uma saída negociada, os principais atores do conflito, Morales e as lideranças de
Santa Cruz, fingem até agora
não ver. A discussão sobre diálogo entre oposição e Morales
está parada no mesmo lugar
desde novembro passado.
O governador cruzenho, Rubén Costas, diz que só conversa
se o governo devolver parte do
IDH, imposto sobre o gás cujo
repasse às regiões foi cortado
em 30% para financiar renda
mínima a idosos. La Paz é irredutível quanto ao tema, já que o
programa é um dos pilares do
projeto de redistribuição de
renda de Morales.
Enquanto a negociação não
vem, o risco é Morales tentar
usar a ampla vitória para avançar unilateralmente com a
Constituição, aprovada pelos
governistas e não pelos dois
terços da Assembléia Constituinte. E vai ser pressionado internamente para fazê-lo, apesar do discurso de integração
entre o texto estatista e pró-indigenismo e os estatutos autonômicos dos departamentos.
É que para avançar com o referendo da Carta o governo não
precisa das regiões, mas do
Congresso. A proposta de consulta tem de passar pelo Senado, dominado pelo partido opositor Podemos. Os líderes da legenda, que rejeitavam a Carta,
apareceram mais dóceis nos últimos dias elogiando o chamado de Morales ao diálogo.
Os governadores vêem aí
uma ameaça: a aliança tática
entre o Podemos e o governo
para isolá-los.
(FM)
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