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Ethel Rosenberg era inocente, diz ex-réu
Após negar acusação por mais de 50 anos, Morton Sobell confessa que ele e Julius Rosenberg espionaram para Moscou
Ethel, executada com o marido em 1953 após ser condenada por conspiração, "era apenas culpada por ser mulher de Julius", diz ele
SAM ROBERTS
DO "NEW YORK TIMES", EM NOVA YORK
Em 1951, Morton Sobell foi
julgado e condenado em companhia de Julius e Ethel Rosenberg, todos os três acusados de
espionagem. O casal foi executado em junho de 1953, na primeira aplicação da pena de
morte por espionagem contra
civis na história americana.
Sobell cumpriu mais de 18
anos de prisão e, ao ser libertado, em 1969, viajou a Cuba e ao
Vietnã e se tornou defensor de
causas progressistas. Reiterou
ao longo dos anos ser inocente.
Mas anteontem Sobell, 91,
reverteu sua posição e esclareceu aspectos de um caso que
continua a alimentar paixões.
Admitiu pela primeira vez ter
sido espião soviético.
E implicou Julius Rosenberg
em uma conspiração que transmitiu aos soviéticos informações militares e industriais
confidenciais, além daquilo que
o governo dos Estados Unidos
definiu como "o segredo da
bomba atômica".
Perguntei a Sobell, que vive
em Nova York, se, como engenheiro elétrico, ele entregou
segredos militares aos soviéticos durante a Segunda Guerra
Mundial, quando a União Soviética era aliada dos EUA. Em
resumo, ele havia sido espião?
"Sim, sim, pode me definir
assim", ele respondeu.
Sobell concorda com a avaliação consensual de historiadores de que Ethel Rosenberg
estava ciente da espionagem de
seu marido, mas não era partícipe. "Ela era apenas culpada
de ser a mulher de Julius."
Ontem os Arquivos Nacionais americanos, em resposta a
um pedido do Arquivo de Segurança Nacional (organização
sem fins lucrativos), deram
acesso a jornalistas e historiadores à maior parte dos depoimentos do caso.
A confissão de Sobell reforça
a tese de que Ethel pode ter sido incriminada indevidamente
pelos promotores.
Opinião do filho
O filho mais novo dos Rosenberg, Robert Meeropol, descreveu a confissão de Sobell na
quinta-feira como "forte". "Eu
sempre afirmei que isso era
uma possibilidade", disse ele.
Na entrevista, Sobell estabeleceu uma distinção entre espionagem atômica e os detalhes de sistemas de radar e engenharia que ele admitiu ter
furtado para os soviéticos. "O
que eu fiz era simplesmente defensivo, um canhão antiaéreo",
afirmou. O dispositivo que ele
menciona, o radar SCR 584, teria sido usado contra aviões
americanos no Vietnã e na Coréia, acreditam especialistas.
Sobell sustenta que os desenhos e outros detalhes da bomba atômica que o governo alegava terem sido fornecidos a
Julius Rosenberg por David
Greenglass, o irmão de Ethel,
não tinham muito valor para os
soviéticos, exceto para comprovar informações obtidas
por outros espiões. Greenglass
era um maquinista do Exército
americano em Los Alamos, local em que a primeira bomba
atômica foi construída.
"O que ele forneceu aos soviéticos era porcaria", disse Sobell sobre Julius Rosenberg,
seu ex-colega no City College
de Nova York, nos anos 30.
Mas a acusação contra eles
foi de conspiração. O governo
precisava apenas provar que os
Rosenberg tinham a intenção
de entregar segredos militares
a uma potência estrangeira.
Depois da detenção de Julius
Rosenberg, Sobell fugiu para o
México e viveu sob falsa identidade. Foi preso e repatriado em
agosto de 1950. Foi sentenciado a 30 anos de prisão. Os Rosenberg foram executados na
cadeira elétrica.
Em entrevista em 2001 para
um livro meu, "The Brother",
David Greenglass reconheceu
ter mentido ao afirmar que sua
irmã havia datilografado suas
anotações sobre a bomba, a
mais grave prova conta ela. A
alegação dele surgiu meses depois do depoimento de Greenglass e de sua mulher, e apenas
semanas antes que o julgamento começasse, em 1951.
Promotores admitiram esperar que a sentença de morte
contra Ethel convencesse seu
marido a confessar e implicar
outros envolvidos -agentes
identificados em comunicações soviéticas interceptadas.
O plano fracassou, disse William Rogers, então subsecretário da Justiça americano. "Ela
pagou para ver nosso blefe",
disse ele, em entrevista.
Falsa acusação
Os depoimentos ao júri divulgados quinta-feira parecem
mostrar ainda mais lacunas no
caso contra Ethel, que tinha 34
anos e dois filhos pequenos. Ela
foi detida ao deixar o tribunal
depois do depoimento. Acatando as objeções de Greenglass,
um juiz federal se recusou a liberar seu depoimento. Mas as
transcrições divulgadas anteontem não trazem a menção
ao fato de Ethel ter datilografado anotações.
"Isso significa que o depoimento de Ruth Greenglass ao
júri contradiz a acusação que
levou Ethel Rosenberg à cadeira elétrica", disse Thomas
Blanton, diretor do Arquivo de
Segurança Nacional, uma organização que contesta as normas
oficiais de sigilo e opera da Universidade George Washington.
Ronald Radosh, um estudioso do caso e um dos que solicitaram a liberação dos arquivos,
disse que o depoimento "confirma o que sempre suspeitamos, ou seja, que a história de
que ela datilografou as anotações foi inventada".
Ainda assim, as transcrições
de depoimentos indicam que
Ethel Rosenberg estava ciente
da conspiração. A idéia de espionar foi mencionada por seu
marido pela primeira vez em
1944, no apartamento do casal,
em Manhattan, de acordo com
Ruth Greenglass. "Fiquei horrorizada", ela afirmou, mas
acrescentou que Ethel "me pediu que falasse com David. Ela
achava que, mesmo que eu fosse contra a idéia, deveria ao menos discuti-la com ele, ouvir o
que ele tivesse a dizer".
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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