São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

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Estrangeiros criam Jerusalém fantasma

Judeus de outros países compram apartamentos e os mantêm vazios durante maior parte do ano, alimentando bolha imobiliária

Com 800 mil habitantes, cidade tem apenas 186 mil apartamentos; escassez vira justificativa para construções polêmicas na parte oriental

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

O interesse crescente de estrangeiros em adquirir imóveis em Jerusalém provocou um fenômeno inusitado: algumas áreas da cidade mais disputada do mundo ameaçam transformar-se em verdadeiros bairros-fantasma.
Preocupada com a tendência e suas consequências socioeconômicas, a prefeitura da cidade enviou recentemente cartas a 9.000 proprietários ausentes pedindo que ocupem ou aluguem seus imóveis.
Além de inflar a bolha que catapultou os preços dos imóveis em Jerusalém, a existência de milhares de apartamentos vazios agrava a decadência econômica da cidade mais pobre de Israel, reduzindo o consumo e a coleta de impostos.
"Gostaria de parabenizá-los por terem comprado imóveis em Jerusalém, a capital eterna do povo judeu", diz a carta assinada pelo prefeito de Jerusalém, Nir Barkat, antes de alertar para o impacto causado pelos residentes-fantasmas.
"Um apartamento vazio significa menos compradores nos mercados, menos crianças nas escolas, menos frequentadores nos cafés e, mais importante, menos imóveis para jovens casais e estudantes", diz Barkat, que fez milhões no setor de tecnologia antes de ser eleito prefeito, no ano passado.
A maioria dos apartamentos vazios pertence a judeus ortodoxos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França, que passam apenas alguns dias por ano em Israel, geralmente em festas religiosas ou familiares.
"É uma loucura", diz Kobi, por trás do balcão de sua pequena mercearia, localizada a poucos metros da residência oficial do presidente de Israel, uma das áreas mais valorizadas de Jerusalém. "Enquanto tudo em volta ficava mais caro, os clientes foram sumindo."
O que motiva o investimento, além do retorno garantido, é a sensação de ter um refúgio no caso de uma onda de antissemitismo em seus países de origem. O resultado: prédios inteiros nas áreas mais exclusivas de Jerusalém ficam vazios boa parte do ano, tornando a escassez de imóveis na cidade ainda mais dramática.
"Para cada apartamento disponível, tenho pelo menos dez interessados", conta o corretor de imóveis Eliran Haviv. "Bairros inteiros ficaram supervalorizados, mas estão vazios. Os donos não querem vender, porque esperam que os apartamentos valorizem ainda mais."
Nas áreas mais exclusivas da cidade, como Talbiye, Rehavia e Colônia Alemã, os preços triplicaram nos últimos dois anos, e um apartamento de dois quartos pode facilmente passar de R$ 800 mil.
Os números confirmam o fosso entre oferta e procura e explicam a bolha imobiliária que alguns temem (e muitos torcem) estar perto de estourar: segundo a prefeitura, há 186 mil apartamentos em Jerusalém, para uma população de quase 800 mil pessoas.
Os altos preços e os novos e luxuosos projetos imobiliários destinados a atrair investidores estrangeiros contrastam com a má situação econômica de 3 em cada 10 moradores da cidade.
A grande concentração de ultraortodoxos e árabes, populações com altos índices de pobreza, faz de Jerusalém a cidade de menor renda em Israel. De acordo com dados divulgados no mês passado pelo Instituto Nacional de Seguros, 32,3% dos residentes são considerados pobres.
A falta de acesso econômico aos bairros mais centrais de Jerusalém força famílias de baixa renda, estudantes e jovens casais a buscar um teto na periferia da cidade.
Esse êxodo acaba gerando tensões não só de caráter social, mas também políticas, pois dá ao governo justificativa para ampliar bairros na parte oriental da cidade, reivindicada pelos palestinos para ser a capital de seu Estado independente.


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