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Com Chávez e petróleo, economia fica imprevisível
Analista afirma que, na Venezuela, "longo prazo" é intervalo de um ano
Presidente alterou, em 11 anos, o marco regulatório de quase todos os setores da economia -em inúmeros casos, mais de uma vez
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
Na semana passada, durante
o programa de TV dominical,
gravado na praça Bolívar, centro de Caracas, Hugo Chávez
apontou o dedo para uma esquina e perguntou: "E esse edifício?". "Tem um comércio privado de joalheria", respondeu
um assessor. "Exproprie-se",
ordenou o presidente venezuelano, que agora quer montar ali
o Museu Bolivariano.
Três dias depois, todos os 90
comerciantes de ouro e joias do
edifício La Francia, alguns no
mesmo local desde os anos
1950, já haviam esvaziado todas
as vitrines e fechado as portas.
Cerca de 2.000 pessoas trabalhavam no prédio.
"Isso foi intempestivo, nos
pegou de surpresa", diz a comerciante Belinda Romero, 28.
A família de seu marido mantinha a joalheria Arte Guyana no
local havia 44 anos. Sentada
diante da loja vazia, disse que
estava ali para o caso de algum
funcionário do governo aparecer, já que a única notificação
havia sido do próprio Chávez.
Obrigada a viver com altos e
baixos econômicos por causa
da dependência quase total do
petróleo (94% das exportações), a economia venezuelana
também tem sido refém da volatilidade imposta pela "revolução socialista bolivariana" imposta por Chávez.
Desde 2007, ele promove
uma agressiva e imprevisível
onda de nacionalizações e expropriações, que incluiu os setores elétrico, de telecomunicações e até o maior shopping
do país, o Sambil La Candelaria,
que estava a semanas de ser
inaugurado e tinha quase todas
as lojas comercializadas.
Além disso, em 11 anos, Chávez alterou o marco regulatório
de praticamente todos os setores da economia -em vários
casos, mais de uma vez.
"Na Venezuela, há um fator
determinante, o comportamento do preço do petróleo,
que sempre vai afetar qualquer
decisão econômica", diz José
Saboin, da consultoria Ecoanalítica. "E, desde Chávez, está a
ideologização, mantendo a economia rentista, mas adaptada à
socialização dos setores produtivos. Basicamente, o país tem
essas duas variáveis."
As constantes mudanças na
economia e o ímpeto estatizante têm afastado investimentos
estrangeiros. Segundo a Cepal
(ONU), a Venezuela, quarta
economia latino-americana,
captou só US$ 5,8 bilhões entre
2004 e 2008. No mesmo período, a pequena República Dominicana, cerca de US$ 7 bilhões.
O desânimo atingiu inclusive
a Petrobras, apesar da proximidade entre o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e Chávez.
A estatal deixou de lado até o
projeto Carabobo, numa das
maiores reservas de petróleo
do mundo, em parte pelo difícil
convívio com a PDVSA -foi
obrigada a ceder à estatal venezuelana o controle acionário de
quatro empresas em 2006.
Sem investimento externo e
com o preço do petróleo longe
dos recordes de meados de
2008, a Venezuela passa por
um momento difícil, com um
cenário de recessão ao lado da
inflação mais alta da América
Latina -mistura batizada de
estagflação pelos economistas.
Para este ano, a Ecoanalítica
prevê um crescimento de 0,9%,
movido principalmente pelo
aumento do gasto público em
ano eleitoral (o Congresso será
renovado em setembro).
"Num país normal, o longo
prazo é de cinco anos", afirma o
economista Pavel Gómez, do
Iesa (Instituto de Estudos Superiores de Administração).
"Na Venezuela, é de um ano."
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