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Diálogo com Cuba não mina repressão
No melhor momento diplomático na região desde 1959, regime mantém criminalização da oposição
Falta de coordenação entre EUA, UE e latinos favorece regime; engajamento de Lula não cabe em "situações extremas", diz analista
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
Beneficiada por governos
simpáticos na América Latina,
Cuba atravessa hoje seu melhor momento diplomático
desde a implantação do regime
castrista, em 1959. No entanto,
o menor isolamento, que incentivaria maior abertura política segundo a tese defendida
pelo governo Lula, não abrandou a máquina repressora do
Estado, dizem analistas ouvidos pela Folha.
Devido em grande parte à
atuação brasileira, Cuba foi
abrigada no Grupo do Rio, em
2008, e ratificada como integrante da futura Comunidade
da América Latina e do Caribe.
Além disso, no ano passado, a
OEA anulou o ato que suspendeu o país caribenho da entidade, após 47 anos de vigência.
No país, porém, a intolerância com a oposição prossegue.
Se não há mais pelotões de fuzilamento -que eliminaram ao
menos 7.000 opositores nos
primeiros anos do regime- e
se desmobilizaram os campos
de trabalho forçado e um presídio para presos políticos que
chegou a abrigar 20 mil pessoas, a ditadura dos Castro
continua criminalizando todas
as formas de dissenso político.
No mês passado, o péssimo
histórico de direitos humanos
do regime voltou ao noticiário
porque o dissidente Orlando
Zapata Tamayo, 42, condenado
a 30 anos de prisão por "desacato" e "desordem", iniciou
greve de fome para exigir melhores condições carcerárias.
O protesto de Zapata, então
um dos quase 60 "prisioneiros
de consciência" de Cuba listados pela Anistia Internacional,
se estendia praticamente sem
repercussão externa. Mas, a
poucos momentos da chegada
do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva a Cuba, em fevereiro,
ele morreu, após quase três
meses de jejum.
"O histórico de direitos humanos em Cuba não tem melhorado desde 2003", afirma
Nik Steinberg, encarregado de
monitorar a situação do país na
ONG Human Rights Watch,
em referência ao ano que Lula
chegou à Presidência.
"O governo continua impondo o conformismo político com
espancamentos, assédio, detenções de curto e longo prazo,
falta de oportunidade de trabalho e outras táticas. O governo
Raúl Castro prendeu dezenas
de pessoas por exercitar suas
liberdades fundamentais e permitiu vários outros prisioneiros políticos presos sob Fidel a
continuar detidos."
Por outro lado, Steinberg critica o embargo econômico
americano, que, segundo ele,
prejudica a população cubana,
gera solidariedade ao regime
castrista e isola os EUA diplomaticamente. Para o analista, a
pressão externa não tem funcionado em parte por falta de
coordenação entre Washington, Europa e América Latina.
A cubano-americana Marifeli Pérez-Stable, do influente
think tank americano Inter-American Dialogue, afirma que
é favorável a abordagens como
as de Brasil e Espanha para lidar com Cuba. No entanto, avalia que há limites na estratégia.
"O regime não tem como reagir de forma inteligente a uma
medida como essa de Zapata",
afirma. E quando desenlaces
como o de Zapata ocorrem, diz,
a "linha dura do exterior dá as
mãos à linha dura do regime"
para que nada aconteça, prejudicando o ensaio de reaproximação entre EUA e Cuba, peça
central do xadrez.
À morte do dissidente seguiu-se um novo protesto: o jejum do opositor Guillermo Fariñas em louvor a Zapata e pela
libertação de 26 presos políticos que estariam doentes.
Questionado, Lula atacou o jejum, dizendo que greve de fome não pode ser "pretexto" para obter libertações.
Manuel Desdín, fundador da
revista on-line "Cubaencuentro", baseada em Madri, diz que
o Brasil falha ao não ser mais
duro em momentos críticos.
"Lula tem tentado se manter à
margem dos temas dos direitos
humanos em Cuba, talvez cultivando uma posição de mediador com uma equidistância dos
EUA e de Venezuela, Bolívia e
Cuba", afirma.
"Essa posição pode ser mantida enquanto não haja situações extremas, como a atual,
em que a rebelião pacífica em
favor da liberação dos presos
políticos alcança tons trágicos.
Não vale dizer que não sabe
quem é A ou B. Nenhum criminoso sacrificaria a vida por presos de consciência", diz.
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