São Paulo, domingo, 14 de março de 2010

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Brasileiros voltam a garimpo sob tensão

Embaixada no Suriname vê indisposição com garimpeiros; 11 suspeitos de ataque ainda estão presos

THIAGO GUIMARÃES
DA REPORTAGEM LOCAL
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM

Cenário de um ataque a garimpeiros brasileiros na véspera do Natal que terminou com saques, incêndios e ao menos 25 feridos, a cidade fronteiriça de Albina, no Suriname, registra retorno intenso desses trabalhadores à região, agora sob um quadro de "paz vigiada" e conflitos latentes.
Mas se antes esses garimpeiros compravam, dormiam e se divertiam no entreposto do rio Maroni onde foram agredidos a golpes de facão e pauladas por surinameses descendentes de quilombolas, os maroons, o local é hoje somente um ponto de passagem rumo às lavras remotas na vizinha Guiana Francesa, onde o garimpo é mais promissor do que no Suriname.
O embaixador do Brasil no Suriname, José Luiz Machado e Costa, descartou motivação xenófoba no ataque -provocado pelo assassinato de um maroon-, porém reconhece que a indisposição contra brasileiros é crescente no país.
"Antes os brasileiros eram "invisíveis" no Suriname, garimpavam em pequena escala, pagavam taxas aos maroons. Hoje estão contratando gente e crescendo. Isso começa a incomodar algumas pessoas, e a tendência é que manifestem resistência", disse o embaixador, em entrevista à Folha.

Tensão
O ambiente conflitivo do garimpo se estende à Guiana Francesa, território que vem aumentando a repressão à atividade. Um exemplo ocorreu na manhã da última quarta-feira, quando a polícia francesa prendeu cerca de 15 lavradores brasileiros na ilha chamada La Gran Rochelle, usada como entreposto e atalho para a subida do rio Oiapoque.
Quando os policiais conduziam os detidos -e mais 600 gramas de ouro e dois barcos apreendidos- para registrar o caso em Saint Georges, cidade mais próxima, foram cercados por cerca de 50 brasileiros, que conseguiram resgatar cinco presos e uma embarcação.
"A sorte deles é que a polícia francesa não reagiu, e só deu tiros de borracha e de advertência", disse o delegado Samuel Elanio, da Polícia Federal (PF) em Oiapoque, no Amapá, que fica a cerca de 15 minutos de barco de Saint Georges.
Para o adido da PF no Consulado-Geral do Brasil em Caiena, Alexandre Messias, a expectativa de impunidade e o lucro movem os garimpeiros brasileiros. "A atividade é tão lucrativa que a maioria acaba voltando, mesmo perdendo ouro. Sabem que jamais serão maltratados [pela polícia francesa], por isso não temem voltar."

Saldo do ataque
No Suriname, as oito vítimas do ataque ainda abrigadas pelo governo brasileiro em hotéis de Paramaribo deixaram os locais na semana passada, com US$ 200 (R$ 352) como ajuda de custo do Itamaraty.
Dos cerca de 40 indiciados sob suspeita de participação no ataque aos brasileiros, 11 continuam presos, segundo o embaixador Costa. Respondem por crimes como lesão corporal, vandalismo, roubo e estupro (o Itamaraty confirmou dois casos de vítimas brasileiras).
A presença brasileira no Suriname se tornou tema de campanha no país, que define novo Legislativo no próximo mês de maio -os membros da Assembleia Nacional elegem o presidente. Criticado pela oposição por conta da situação em Albina, o governo de Ronald Venetiaan inaugurou na última sexta-feira uma nova unidade policial na cidade, que conta com 20 mil habitantes.
"A presença do Estado lá [Albina] mudou, mas não muito", diz o ex-garimpeiro José Paulo Ribeiro, hoje empresário e líder de um conselho de brasileiros no Suriname.


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