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Para analistas, reforma neoliberal
é incapaz de levar igualdade à AL
DO CONSELHO EDITORIAL
A desaprovação às privatizações, um pouco o símbolo maior
das reformas neoliberais adotadas pelos países latino-americanos na década de 90, parece consequência do fato de que elas foram incapazes de quebrar a desigualdade social que é a chaga
aberta na região.
Culpa do modelo? Sim, acha Edward Luttwak, pesquisador de Diplomacia Preventiva para o Centro para Estudos Estratégicos Internacionais.
O teorema de Luttwak é completo: primeiro, lembra que o modelo neoliberal agravou a desigualdade mesmo no país-símbolo
dele, os Estados Unidos.
Depois, aponta os fatores que
fazem com que o modelo seja
aceito nos EUA, mas que inexistem na América Latina, a saber:
1) "Nos EUA, o sistema jurídico
pune os excessos, como no caso
Microsoft" (a Justiça determinou
a divisão da empresa). No Brasil,
diz o pesquisador, "a Microsoft
seria dona da Presidência da República";
2) "Os norte-americanos são
calvinistas e, como tais, se são perdedores, culpam a si mesmos. Na
América Latina católica, os perdedores culpam o sistema";
3) o sistema penal norte-americano funciona. "Os perdedores
não calvinistas vão para a cadeia
(já são 2 milhões), assim como
vão para a cadeia os que deixam
de pagar impostos". Luttwak diz
que, dos 8.000 prisioneiros de instituições federais, 25% lá estão
por evasão de impostos, situação
impensável na América Latina.
Mas Luttwak está no extremo
do leque de opiniões sobre as reformas neoliberais. A maioria dos
consultados pela Folha aponta
nelas apenas insuficiências, não
incapacidade para resolver o problema da desigualdade.
"As sociedades latino-americanas, em especial a brasileira, eram
altamente desiguais e com altos
níveis de pobreza antes da implementação das novas políticas",
lembra Alan Angell (Oxford).
Nancy Birdsall (do Instituto
Carnegie para a Paz Internacional) prefere atribuir a insatisfação
"à incapacidade das reformas para atender a classe média". Birdsall acha que "as reformas pró-mercado ajudaram os mais pobres (especialmente por eliminar
a hiperinflação) e os 10% dos lares
cujos adultos têm educação universitária", mas a classe média
"sente-se frustrada".
Corolário inevitável: "A democracia liberal depende, em última
instância, da classe média. Ou seja, está ainda assentada sobre uma
frágil e insegura classe média".
Francisco Panizza (London
School of Economics) lembra outro fator de insatisfação: "O crescimento econômico (que é condição necessária mas não suficiente
para aliviar a pobreza) tem sido
errático e insuficiente".
Para Panizza, "a pobreza é um
problema que vai muito além das
questões puramente econômicas.
Sua superação requer estratégias
de requalificação profissional,
criação e expansão de novos bens
coletivos como a Internet".
Na mesma direção vai Riordan
Roett (John Hopkins University):
"Há estudos suficientes para demonstrar que a desigualdade e a
pobre distribuição de renda na região estão diretamente vinculadas
ao déficit educacional. Os latino-americanos não são suficientemente educados para competir".
Mas há quem ache que as reformas neoliberais acabaram sendo
pura e simplesmente desperdiçadas. Caso de Kenneth Maxwell
(Council on Foreign Relations).
"Supunha-se que as políticas liberais forneceriam os meios para
que os governos cumprissem a
obrigação de prover serviços e segurança pessoal melhoradas. Em
vez disso, os recursos da privatização foram usados para pagar
dívidas ou cobrir o alto custo de
juros de mais endividamento."
Pior: "A oportunidade não voltará, pois as privatizações foram
negócio de uma única vez. As pessoas entendem isso muito mais
do que pensam os políticos".
O item da pesquisa Latinobarômetro sobre privatizações parece
dar razão a Maxwell.
(CR)
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