São Paulo, domingo, 14 de maio de 2000


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Esquerda não "decola" apesar do descontentamento

DO CONSELHO EDITORIAL

Se há descontentamento com o funcionamento da democracia, gerida por governos de direita ou, no máximo, de centro, o lógico seria que a esquerda surgisse como a alternativa de poder.
Não é o que está acontecendo na América Latina. Por quê?
"Enquanto as economias permanecerem dependentes dos mercados e dos capitais, não há outra via possível", responde Kenneth Maxwell (Council on Foreign Relations).
Vai mais longe Lowell Fleischer (Centro de Estudos Estratégicos Internacionais): "A esquerda está morta. Há uma só via, o chamado modelo neoliberal, modificado para levar em conta diferenças nacionais ou regionais".
Na contramão, Alan Angell (Oxford) recusa-se "a escrever o obituário da esquerda", por acreditar que "é impossível predizer o futuro dos desenvolvimentos políticos; quem haveria de prever, nos anos 80, que as idéias dominantes na América Latina logo viriam a ser as do neoliberalismo?".
Angell admite, em todo o caso, que "a esquerda na América Latina não tem um conjunto convincente de respostas para a questão de como combinar crescimento econômico sustentado com justiça social". Acrescenta: "Mas ninguém mais tem".
Cynthia McClintock (George Washington University) concorda com Angell no fato de que "a esquerda tem sido incapaz de construir uma mensagem desde a queda do Muro de Berlim".
Mas aponta também uma circunstância agravante para o descontentamento da sociedade: "Muitos líderes elegem-se como centro-esquerdistas, mas governam como centro-direitistas, o que frustra os cidadãos".
Outro especialista a apontar carências nas formulações de esquerda é Francisco Panizza (London School of Economics):
"O problema da esquerda latino-americana é que esteve historicamente associada a categorias como classe, Estado, povo e nação, que hoje são profundamente problemáticas. Também tendeu a usar como termos equivalentes globalização e neoliberalismo, que são questões diferentes. A globalização aumentou o poder do capital, mas tem também uma dimensão democratizante e internacionalizante que a esquerda não consegue representar".
Tudo somado, tem-se que a alternativa ao modelo neoliberal pode ser, na prática, mais assustadora do que a esquerda sempre foi para o status quo, pelo menos na visão de Maxwell (Council on Foreign Relations):
"A alternativa mais perigosa hoje é a do colapso do Estado onde o narcodinheiro manda. A Colômbia está perto disso. Ou Estados cujos sistemas políticos não podem mais lidar com demandas contraditórias de uma população zangada e mobilizada. O Equador está perto disso. Ou Estados em que velhos autocratas, mesmo eleitos, não podem abandonar o poder e usam meios cada vez mais pesados para frustrar o processo democrático." (CR)


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