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SAÚDE
Fração feminina do total de infectados é de 48%, contra 35% em 1985; dos 15 aos 24 anos, elas estão 3 vezes mais sujeitas ao vírus
Mulheres são 60% dos jovens com Aids
LUCIANA COELHO
DA REDAÇÃO
Os homens não são mais o alvo
primário da epidemia de Aids que
assola o mundo. Dos portadores
do HIV que têm hoje entre 15 e 24
anos, 60% são mulheres, alerta
um relatório da ONU. Pior: nessa
faixa etária, elas têm, em média,
três vezes mais chance do que eles
de serem contaminadas, diz o documento. E a principal forma de
infecção é o sexo heterossexual.
O estudo, preparado pelo Unifem (Fundo de Desenvolvimento
das Nações Unidas para as Mulheres), será divulgado hoje na 15ª
Conferência Mundial de Aids, em
Bancoc (Tailândia) e foi obtido
antecipadamente com exclusividade no Brasil pela Folha.
Nele, são discutidas as principais causas e conseqüências de a
proporção de mulheres sexualmente ativas (entre 15 e 49 anos)
infectadas no mundo ter subido
em oito das dez regiões pesquisadas entre 2001 e 2003 e chegado a
48%. Em 19 anos, foi um salto de
13 pontos.
A proporção só não subiu na
África Subsaariana -que concentra mais da metade dos casos
do mundo e onde as mulheres já
perfazem 57% da população vivendo com Aids-, no norte da
África e no Oriente Médio.
O mapa traçado pelo Unifem
mostra que a fração feminina de
infectados pelo HIV cresce de
acordo com o grau de pobreza e
desenvolvimento da região. Enquanto na África Subsaariana elas
são 57% dos infectados, na América do Norte e na Europa ocidental são cerca de 25%, e na Oceania,
20%. Já as latino-americanas são
36% em sua região. Os números
do relatório foram obtidos por
outras agências da ONU, como a
Unaids, ou provêm de governos e
de ONGs reputadas.
Violência e desinformação
Os maiores impulsos para esse
salto, diz o Unifem, vêm da violência sexual e da falta de informação -entra aí a defasagem
educacional da população feminina em boa parte do mundo. Uma
pesquisa citada no relatório infere
que 700 mil casos de infecção de
jovens adultos seriam evitados
por ano se todas as crianças tivessem educação primária completa.
Há, ainda, o problema cultural:
enquanto em muitos lugares é socialmente aceito que o homem tenha várias parceiras, a mulher
tem de se manter fiel e abdicar do
preservativo com seu parceiro. A
cultura do silêncio, diz o estudo, é
um dos maiores aliados do vírus.
Porque as mulheres têm menos
direitos e poder do que os homens em boa parte do globo, elas
estão menos aptas a negociar a
prática segura de sexo. A pobreza,
por sua vez, tem maior efeito em
termos de disseminação da Aids
sobre a população feminina, pois
estimula o tráfico de mulheres e
tende a empurrar mais delas para
a prostituição. Em lugares como a
África do Sul, é comum que homens mais velhos assumam as
despesas de uma ou mais jovens
em troca de favores sexuais.
Outro fator que tem contribuído para disseminar o vírus em ritmo acelerado entre elas é o fato
de, cada vez mais, o estupro sistemático se tornar arma de guerra.
Durante o genocídio em Ruanda
(1994), centenas de milhares de
mulheres foram estupradas, muitas por portadores do HIV.
A violência doméstica também
segue preocupante: estudos citados no relatório indicam que, dependendo do lugar no mundo, de
10% a 69% das mulheres são vítimas. Espancadas e humilhadas,
muitas temem pedir que seus parceiros abandonem um comportamento sexual promíscuo ou usem
preservativo, criando um círculo
vicioso, já que, uma vez infectadas, elas passam a ser espancadas
ou são abandonadas. Sem romper
o ciclo, enfatiza o Unifem, será
impossível conter o vírus.
Impacto desigual
As mulheres também são, segundo o relatório, as mais prejudicadas pelo crescimento da epidemia de Aids. Em 90% dos casos,
são elas que assumem a tarefa de
cuidar de parentes contaminados
ou de crianças que se tornam órfãs por causa da Aids. Meninas e
adolescentes, em muitos lugares,
são as primeiras a serem tiradas
da escola para cumprir a função.
Sem educação, acabam colaborando para a propagação do vírus.
Sem rendimentos e economicamente dependentes do homens,
ficam mais suscetíveis à infecção,
pois dependem deles para comprar preservativos e acabam sofrendo mais abusos.
A solução proposta pelo Unifem é garantir que as mulheres,
sobretudo as adolescentes, tenham conhecimento e meios para
evitar a infecção. Hoje, só 20% das
mulheres que precisam de acesso
a serviços de prevenção os têm.
Um bom caminho, sugere o relatório, é fomentar os direitos femininos, instituir a tolerância zero para a violência contra a mulher, estimular a igualdade de direitos e apoiar as entidades anti-Aids geridas por mulheres.
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