São Paulo, sexta-feira, 14 de setembro de 2007

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Cartaz antiimigrante expõe Suíça xenófoba

Pôster integra campanha de partido com maior bancada no país, onde 25% dos trabalhadores são estrangeiros

PAUL VALLELY
DO "INDEPENDENT"

À primeira vista, o pôster parece um desenho infantil inocente em que três ovelhas brancas aparecem ao lado de uma ovelha negra. Mas logo você percebe que os três animais brancos estão em pé sobre uma bandeira suíça, e um deles empurra discretamente a ovelha negra para fora com um coice.
Com o lema "por mais segurança", o cartaz não é trabalho de uma organização marginal de neonazistas: foi concebido e divulgado pelo Partido do Povo Suíço (Schweizerische Volkspartei, ou SVP), dono do maior número de cadeiras no Legislativo e membro da coalizão governista. Para a ONU, que chegou a pedir explicações a Berna, trata-se de um símbolo sinistro da ascensão de novas formas de racismo e xenofobia no coração de uma das mais antigas democracias do mundo.
Dono de um histórico que inclui uma campanha (fracassada) por um referendo para proibir a construção de minaretes em mesquitas e outra (bem-sucedida) por leis de imigração mais severas, usando a imagem de mãos negras afundando em uma vasilha de passaportes suíços, o SVP agora está em dupla campanha antes das eleições gerais de outubro.
O partido busca as 100 mil assinaturas necessárias para promover um referendo sobre o retorno ao código penal de uma cláusula que permite aos juízes deportar estrangeiros responsáveis por crimes graves quando eles tiverem terminado de servir suas sentenças de prisão.
Anunciou também que proporá uma medida que permitiria que toda a família de um criminoso menor de idade fosse deportada tão logo ele fosse sentenciado por um delito grave -a primeira lei do tipo na Europa desde a prática nazista do Sippenhaft (responsabilidade familiar), sob a qual os parentes dos criminosos eram considerados responsáveis por seus crimes e estavam sujeitos às mesmas punições que eles.

Reflexo continental
A proposta servirá de referência não só para a Suíça -onde um quarto dos trabalhadores é composto de imigrantes- como para o resto da Europa, que tem visto crescer a divisão entre o multiculturalismo liberal e o isolacionismo conservador no discurso político. O que está em jogo não é simplesmente a falta de apreço pelos estrangeiros ou uma desconfiança quanto ao islamismo, mas algo muito mais importante. Trata-se de um confronto que chega ao cerne da crise de identidade na Europa e nos EUA e envolve a forma pela qual vivemos em um mundo que mudou radicalmente desde o fim da Guerra Fria, com o crescimento da economia globalizada, o aumento nos fluxos migratórios, a ascensão internacional do islamismo e o terrorismo do 11 de Setembro.
A Suíça é um exemplo forte por conta da complexa rede de influências que encontra expressão no SVP. O país tem as mais duras leis de naturalização da Europa. Para se candidatar à cidadania, é preciso viver legalmente no país por pelo menos 12 anos, pagar impostos e não ter ficha criminal. O pedido mesmo assim pode ser recusado pela comuna em que o candidato vive, que se reúne para perguntar se ele fala alemão, tem emprego e está integrado ao povo suíço.
O governo federal quer tirar a decisão das comunidades locais. Mas suas propostas foram derrotadas em dois referendos.
A questão vai além da política. E o drama em curso, expresso em linguagem tão politicamente incorreta no cartaz, repercutirá não somente na Europa mas no mundo em geral.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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