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Bachelet quer tirar verba milionária de militares chilenos
Projeto pretende acabar com a Lei do Cobre, que destina 10% do lucro com a exportação do metal às Forças Armadas
Dinheiro tem de ser gasto com equipamentos ou modernização, o que põe o Chile entre os mais bem armados na América Latina
FLÁVIA MARREIRO
DA REDAÇÃO
O governo Michelle Bachelet
planeja acabar com um dos
maiores trunfos das Forças Armadas do Chile, herança da ditadura de Augusto Pinochet
(1973-1990): a chamada Lei do
Cobre, que obriga que 10% do
obtido com a venda do principal produto chileno ao exterior
seja remetido aos militares.
A idéia é ventilada pela presidente desde que ocupava o Ministério da Defesa, entre 2002 e
2004, e foi promessa de campanha. Agora ganhou corpo em
forma de um projeto que está
prestes a ser apresentado no
Congresso do Chile.
Com os preços do cobre nas
alturas -conseqüência do crescimento em especial da China-, a discussão sobre a fatia fixa dos militares do dinheiro da
Codelco, a estatal chilena do
produto, voltou a esquentar.
No ano passado, a Codelco
teve lucro recorde de US$ 9,2
bilhões. Algo em torno de US$ 1
bilhão teve de ir às Forças Armadas ou "10% do retorno em
moeda estrangeira pela venda
da produção de cobre e seus
subprodutos", tal como prescreve a Lei Reservada do Cobre,
criada na década de 50 e convenientemente amplificada e
mantida por Pinochet na Constituição de 1989.
Mais: pela norma, o dinheiro
só pode ser usado para compra
de armamentos ou aplicado em
modernização. Há ainda um orçamento mínimo advindo do
governo central, combinação
que deixa os militares chilenos
em situação mais que confortável na região, onde, em geral, os
orçamentos da Defesa são magros. "A América Latina é a zona no mundo onde a relação orçamento de defesa/PIB é a
mais baixa no planeta", disse à
Folha o especialista em defesa
uruguaio Juan Rial.
"As exceções são a Colômbia,
afetada pela interferência americana, o Chile, por causa dos
excedentes do cobre, e a Venezuela, que, em razão da renda
extra do petróleo, embarcou
em uma onda de compras importante", completou ele, que é
um dos diretores da Resdal
(Rede de Segurança e Defesa da
América Latina).
Para efeito de comparação,
no autorizado no Orçamento
de 2007 para o Ministério da
Defesa brasileiro, país 11 vezes
maior e com seis vezes mais militares que o Chile, só há R$ 2,4
bilhões para investimentos.
A Lei do Cobre é, para especialistas, "a maior dívida"" do
processo de transição das Forças Armadas à democracia.
"Enquanto os militares tiverem verba para gastar com o
que quiserem, sem prestar contas e sem participar de maneira
igualitária da partilha dos recursos públicos, há uma dívida
do Chile com a democracia",
diz o analista chileno Daniel Álvarez, ex-editor da revista
"Forças Armadas e Sociedade".
Orçamento estável
Na outra ponta, militares e
deputados moderados da coalizão de centro-esquerda de Bachelet argumentam que foi a
constância orçamentária a promotora da modernização das
Forças Armadas. Na semana
passada, o comandante-em-chefe do Exército, Ricardo Izurieta, foi ao Senado defender
que, estratégicas, as forças devem "ter um orçamento estável"; ele disse que os militares
estudam "junto com o governo", sugerindo que a Lei do Cobre pode ser apenas modificada, e não revogada.
Mas, para Álvarez, "apesar do
desejo explícito" de Bachelet de
mudar a lei, "o momento político não é favorável". "Bachelet
chegou ao poder com mais problemas do que esperava. São
muitos flancos abertos e os militares ainda são muito influentes", diz, aludindo à crise dos
transportes em Santiago que
fez cair a aprovação do governo.
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