São Paulo, sábado, 15 de maio de 2010

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Rússia contesta otimismo do Brasil sobre Irã

Ao lado de Lula, presidente Medvedev estima em 30% probabilidade de que a visita de Lula a Teerã resulte em um acordo

Brasileiro, que visita hoje o Qatar antes de chegada amanhã ao país persa, diz que, em escala de 1 a 10, chance de acordo é de 9,9


Sergeu Chirikov/Associated Press
O presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, recebe o colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, no Kremlin, sede do governo russo

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A MOSCOU

Embora tentando exibir um discurso afinado sobre o Irã, Brasil e Rússia mostraram ontem clara dissonância em relação às chances de que seja obtido um acordo sobre o impasse nuclear durante a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país persa.
Em Moscou, penúltima escala antes de Teerã, Lula recebeu o aval do presidente russo, Dmitri Medvedev, para os esforços do Brasil de costurar um entendimento que dê garantias sobre o caráter civil do programa nuclear iraniano.
Em entrevista concedida após reunião com Medvedev no Kremlin, o brasileiro disse que está "cada dia mais otimista" quanto a um acordo com o Irã. Afirmou ainda que confia nos "30 anos de experiência como negociador político" para convencer o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.
Medvedev, que acompanhava sorridente as palavras de Lula, foi bem mais moderado em sua opinião sobre as chances de sucesso do Brasil. "Se o presidente Lula é otimista, eu também vou ser. Eu diria que as chances [de acordo] são de 30%" disse o líder russo.

9,9
Ao ouvir a avaliação do colega russo, Lula abriu os braços e disse, fora do microfone: "Então você não está otimista". Em seguida, o presidente brasileiro disse que, de 1 a 10, acredita que as chances de um acordo nuclear com o Irã sejam de 9,9.
O grau de expectativa sobre um desfecho positivo para o impasse já fora elevado na véspera pelo chanceler do Irã, Manouchehr Mottaki. Ele disse ter esperança de que um entendimento seja alcançado em um encontro trilateral em Teerã com a participação do premiê turco, Recep Tayyip Erdogan.
Brasil e Turquia assumiram nas últimas semanas as negociações com o Irã para tentar implementar a proposta apresentada há sete meses pela AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), que o Irã ainda resiste em aceitar.
De acordo com o plano, o Irã enviaria quase todo o seu estoque de urânio pouco enriquecido para outro país e receberia combustível nuclear adequado para uso médico, mas não para fins militares.
Insatisfeita com a falta de clareza do programa nuclear iraniano, a Rússia tem se mostrado inclinada a apoiar uma nova rodada de sanções contra Teerã no Conselho de Segurança da ONU, como tem defendido o governo americano.

"Amigo Ahmadinejad"
Ontem o presidente russo disse que a visita de Lula a Teerã pode ser "a última chance" de um acordo, repetindo cálculo externado na véspera por um alto diplomata americano.
"Se o Brasil não convencer o Irã, o Conselho de Segurança vai ter que seguir com as propostas do grupo dos seis [Rússia, China, EUA, França, Reino Unido e Alemanha]", disse Medvedev.
Depois de chamar Medvedev de "meu amigo", pegando no braço do presidente russo várias vezes durante a entrevista, Lula usou o mesmo termo para se referir a Ahmadinejad.
"Nenhum ser humano é 100% bom ou ruim", disse. "Todos temos um ponto de equilíbrio, e o presidente Ahmadinejad tem um lado muito interessante para que a gente possa construir um acordo."
"Vou usar tudo o que aprendi na política nesses 30 anos para convencer o meu amigo Ahmadinejad a fazer o acordo que a agência propõe e que todo mundo quer", concluiu.
De Moscou, Lula embarcou para Doha (Qatar). A questão iraniana também deve ser um dos temas principais da visita, já que o emirado vê com grande preocupação a perspectiva de uma bomba nuclear iraniana.


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