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SOCIEDADE
Onda de repressão ocorre na esteira de casos hediondos, incluindo os de 2 meninas seqüestradas e mortas na Flórida
EUA apertam cerco a criminosos sexuais
ROBERT WORTH
DO "NEW YORK TIMES"
As autoridades locais do condado de Hillsborough, Flórida,
aprovaram em junho a proposta
de proibir a entrada de criminosos sexuais condenados em abrigos públicos contra furacões. Em
Ohio, promotores começaram a
tomar medidas para expulsar criminosos sexuais que vivem perto
de escolas. E, nos últimos meses,
as autoridades locais de cidades e
condados espalhados pelos EUA,
incluindo Binghampton (Nova
York) e Brick (Nova Jersey), aprovaram leis que, na prática, vão expulsar qualquer pessoa condenada por um crime sexual contra
um menor de idade.
A nova onda de repressão acontece na esteira de vários casos hediondos e amplamente divulgados, incluindo os de duas meninas, Jessica Lunsford, 9, e Sarah
Lunde, 13, que foram seqüestradas e mortas neste ano na Flórida
por criminosos sexuais cadastrados. Embora legisladores estaduais em todo o país tenham proposto leis semelhantes, autoridades locais eleitas dizem que vêm
recebendo tantas ligações de eleitores ansiosos que não podem esperar por mais tempo.
"Essas medidas são um pedido
de socorro", declarou Richard
Bucci, prefeito de Binghamton,
onde uma lei proibindo a presença de criminosos sexuais, aprovada em maio, foi suspensa até ser
resolvido um mandado de contestação registrado em tribunal.
"Existe a preocupação ampla de
que esses indivíduos tendem a
reincidir em seus crimes."
As novas leis normalmente
proíbem os criminosos de morar,
trabalhar e, em alguns casos, até
mesmo ficar a menos de 750 metros de distância de uma escola,
uma creche, um parque ou um
ponto de ônibus escolar. Em alguns casos, isso significa que infratores não podem nem sequer
morar ou trabalhar na cidade.
Bucci e outras autoridades locais
que redigiram as leis dizem que a
intenção é simples: manter infratores sexuais o mais longe possível das crianças.
Mas muitos psiquiatras forenses, defensores de vítimas e autoridades policiais dizem que o esforço de manter infratores sexuais
à distância dificilmente tornará as
cidades mais seguras. Eles afirmam que outras soluções, entre
elas a aplicação de penas de prisão
mais longas, seriam mais eficazes,
embora possam custar mais.
De acordo com Ernie Allen, presidente do Centro Nacional para
Crianças Desaparecidas e Exploradas, as restrições podem gerar
um senso de segurança falso, na
medida em que muitos criminosos sexuais condenados não viviam nem trabalhavam perto de
suas vítimas. As leis também podem acabar fazendo que os criminosos sexuais sejam transferidos
de uma cidade para outra, desencadeando uma espiral de medidas
cada vez mais intransigentes.
Para alguns especialistas, um
perigo mais grave é que as leis podem fazer alguns infratores sexuais sumir de vista e afastar-se
das fontes de estabilidade em suas
vidas, o que talvez aumente o risco de que venham a cometer novos crimes.
"Quando você empurra os criminosos para fora das regiões
mais povoadas, eles podem perder acesso a trabalho e a tratamento, o que os tornará mais difíceis de rastrear e acompanhar",
explicou Jill Levenson, pesquisadora sobre violência sexual da
Universidade Lynn, em Boca Raton, Flórida, que, neste ano, publicou um estudo sobre as leis de zoneamento de infratores sexuais.
As novas iniciativas de zoneamento surgem num momento
em que muitos Estados estão procurando fortalecer as medidas federais como a Lei de Megan, de
1996, assim chamada em homenagem a uma vítima de Nova Jersey. A lei requer que as autoridades policiais informem às suas comunidades sobre a presença de
infratores sexuais em seu meio.
Hoje existem mais de 500 mil infratores sexuais cadastrados nos
EUA. A discussão pública se intensificou depois dos assassinatos
das meninas na Flórida. Em maio,
a revelação de que alguns infratores sexuais estavam recebendo
Viagra financiado pelos contribuintes, através do Medicaid, provocou ultraje nacional, e o Congresso rapidamente aprovou uma
medida que proíbe infratores de
receber os medicamentos.
Um motivo de preocupação comum a vários lugares é proporcionado pelas falhas nas políticas
de notificação e cadastramento
público de infratores. Em Nova
York, onde alguns infratores devem sair do cadastro a partir do
próximo ano, segundo os prazos
previstos em lei, o governador
George Pataki propôs que eles
permaneçam no cadastro de maneira vitalícia. Uma legislação federal pendente quer criar um cadastro nacional para preencher as
brechas dos registros nacionais.
Algumas propostas, porém, vão
mais longe. No Alabama, a Assembléia Estadual aprovou por
unanimidade, em julho, a exigência de castração química de alguns criminosos (o Senado estadual não ratificou a medida). Na
Flórida, em maio, o governador
Jeb Bush assinou uma lei que vai
aumentar as penas para pessoas
que molestam crianças menores
de 12 anos e obrigá-las a usar rastreadores de maneira vitalícia.
Outros Estados, incluindo Nova
York e Nova Jersey, analisam a
possibilidade de criar leis prevendo supervisão mais rígida dos infratores, através de rastreadores
GPS, visitas mais freqüentes de
agentes de condicional e imposição de limites a locais onde os infratores podem trabalhar e viver.
"Esses predadores parecem gravitar em torno dessas áreas
-querem se aproximar de todo
lugar onde há crianças", disse o
senador estadual de Nova Jersey
Leonard Connors Jr., republicano
que é o principal proponente de
um projeto de lei que quer proibir
criminosos sexuais condenados
de viver a menos de 150 metros de
distância de qualquer escola ou
creche do Estado. "Eles não conseguem impedir-se de fazê-lo. Então cabe a nós proteger as crianças
e garantir que os infratores sexuais fiquem longe delas."
Muitas das novas leis parecem
ser movidas pela percepção de
que a maioria dos infratores sexuais certamente vai reincidir em
seus crimes e que apenas as medidas mais drásticas poderão impedir que o façam. De fato, uma série de estudos já constatou que os
pedófilos -o grupo de infratores
sexuais que provoca mais medo
público- têm índices de reincidência de mais de 50% e não tendem a reagir a tratamentos.
As primeiras leis de demarcação
de distância surgiram há quase
dez anos, e hoje 14 Estados americanos já aprovaram algumas versões delas. Alguns Estados, porém, expressam dúvidas quanto à
eficácia das leis. Os Estados do
Minnesota e do Colorado estudaram a possibilidade de adotar versões da lei, e, depois de encomendar estudos sobre o assunto, optaram por não fazê-lo.
O estudo feito no Minnesota, divulgado em 2003, não constatou
qualquer relação entre a proximidade dos infratores com escolas e
o risco de que eles cometam novos crimes. A conclusão foi que a
adoção de novas restrições dificultaria o rastreamento de infratores e não aumentaria a segurança da comunidade.
Tradução de Clara Allain
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