São Paulo, sábado, 15 de outubro de 2005

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REINO UNIDO

Polícia tem ordem para multar comportamento anti-social, como jogar lixo no chão ou fazer muito barulho

Governo quer que britânicos tenham boas maneiras

CESAR SORIANO
DO "USA TODAY"

Outrora exportadora de bons modos, a Grã-Bretanha agora tem que aprender. A situação chegou ao ponto de o Parlamento dar à polícia poderes especiais para tratar comportamentos anti-sociais.
Os maus modos britânicos aparecem na mídia com "yobs" (de "boy", menino, ao contrário) que assediam transeuntes. Engravatados passam empurrando sem pedir desculpas e clientes, ao celular, pagam sem olhar para o caixa.
O primeiro-ministro Tony Blair e a rainha Elizabeth 2ª pediram neste ano ao país uma "cultura do respeito". Muitos livros sobre o tema foram publicados em 2005. Lynne Truss lançará "Talk to the Hand: The Utter Bloody Rudeness of Everyday Life" (algo como "Fale com Minha Mão: a Maldita Agressividade Cotidiana").
Ian Gregory, reverendo que idealizou o Dia da Cortesia (6 de outubro), diz: "Perdemos a reputação de educados".
Em 1999, o Parlamento deu à polícia poder para dar ASBOs (inglês para "ordens de comportamento anti-social") por bebedeira, desordem, pichação, lixo no chão, mendicância agressiva e mesmo por jardins desarrumados. Tais fatos "podem causar incômodo, alarme ou desordem", de acordo com o site governamental de prevenção ao crime.
Nas últimas seis semanas, mais de 4.600 ASBOs foram aplicadas. A pena para infrações sérias, como assédio repetido, pode chegar ao equivalente a US$ 35 mil em multas ou a cinco anos de cadeia. O mais comum é o banimento temporário de ônibus ou bares.
Colin Gill, psicólogo da Universidade de Leeds, diz que boas maneiras vêm e vão com o tempo. Os modos britânicos -por exemplo, o uso de "senhor" ou simplesmente de "por favor"- surgiram no século 17 e floresceram no século 19 para proporcionar diálogo civilizado a pessoas de culturas e opiniões diferentes. "O culto da polidez tem a ver com o Império Britânico, a idéia de que estava no topo e que tinha a missão de civilizar o mundo", diz Gill. "Modos são um código para conviver."
Embora a intenção possa ter sido nivelar o império, o código ajudou a distinguir a classe dominante. "Reforçou uma divisão social entre comandantes e comandados. Modos passaram a identificar a elite", Gill conclui.
Depois da Segunda Guerra, o império começou a desmoronar, e com ele o comportamento. Para Gill, com a ascensão da classe média e a liberdade pessoal trazida em parte pela cultura pop americana, bons modos foram descartados como antiquados e elitistas.
Gregory lembra: "Pessoas que vêm visitar notam que nosso comportamento não é melhor nem pior que em qualquer lugar".
A inglesa Penny Palmano, com três filhos, diz que se cansou da "falta generalizada de respeito das crianças". Ela escreveu dois livros para crianças. Palmano culpa o tratamento mais informal dos pais nas últimas décadas. "Muitos pais pensam que educação é opcional, como vidro elétrico no carro. São habilidades para a vida. Crianças ficam em desvantagem se não sabem como se portar."
O humorista Simon Fanshawe tem uma postura diferente. "Na verdade, não é tão ruim." Ele explora razões antropológicas e históricas dos bons modos no livro "The Done Thing" ("O Usual") e diz que só recentemente os britânicos começaram a procurar a felicidade pessoal. Em outras palavras, "o que importa sou eu".
"Derrubamos autoridades que antes a sociedade britânica aceitava sem questionar", diz. Ele distingue rejeição a autoridades e o comportamento anti-social que prevalece. "Dizem que é "meu direito" fazer isso ou aquilo. Não, não é seu direito gritar ao celular ou tocar som alto. É egoísmo."


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