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PC admite empresários, outrora
"inimigos", para tentar controlá-los
FREDERIC BOBIN
DO "LE MONDE", EM PEQUIM
Atualmente, a China vive um
momento espetacular para seu setor privado. Começada há mais
de uma década, a mudança na
paisagem socioeconômica do país
foi tão radical que o regime é obrigado agora a inseri-la na constituição do Partido Comunista.
Ao lado das mudanças na cúpula do PC, a reabilitação dos empresários -considerados "inimigos da classe trabalhadora" no
passado- foi um dos pontos
principais do congresso do partido, realizado em Pequim.
Após anos de resistência ideológica, tornou-se impossível ocultar
a realidade. Esta pode ser resumida assim: o número de empresas
privadas cresceu em 35% ao ano
durante a década passada; o setor
privado responde por 25% da
produção industrial do país e emprega 11% de sua população ativa,
segundo estatísticas oficiais.
Além disso, desconsiderando a
agricultura, ele representa pouco
mais de 30% do PIB (total de riquezas produzidas no país).
No que se refere à criação de
empregos, essa agitação econômica permite compensar -em
parte, é verdade- o declínio das
empresas estatais. Assim, é possível compreender por que os dirigentes do PC, tão preocupados
com a "estabilidade social", dão
tanta atenção ao setor privado
nos últimos tempos.
Esse processo seguiu uma lógica
incongruente, fiel às "características chinesas", segundo o jargão
oficial. O setor privado cresceu à
margem de um sistema que deveria ser dominado pelo setor público, de acordo com os dirigentes
comunistas. No passado, o objetivo dos empresários era revitalizar
as empresas estatais, reformando
sua orientação administrativa.
No início dos anos 90, ninguém
falava em privatizá-las. Mas, em
1995, com o lançamento de uma
política que visava a manter as
grandes empresas e a "deixar partir" as pequenas que tivessem
problemas, a cúpula comunista
passou a leiloar algumas empresas ou a facilitar sua aquisição por
outras firmas.
Porém essa privatização desempenhou um papel marginal na expansão do setor privado chinês,
que, essencialmente, floresceu
graças a incontáveis pequenas iniciativas -por conta de um movimento de descentralização que
acompanhou a "política de reformas e de abertura".
A tendência teve início no interior e só chegou aos grandes centros mais tarde. Um dos maiores
ícones da "China capitalista" é o
setor de serviços das grandes cidades, sobretudo do leste do país.
Demora do PC
O PC tardou a perceber a dimensão das mudanças. Afinal,
elas iam de encontro às opções estratégicas iniciais do regime. A categoria "empresa privada" só passou a ser reconhecida oficialmente em 1987.
Em 1992, em outro congresso
do partido, os empresários ganharam alento graças à aprovação do conceito de "economia socialista de mercado", do líder
Deng Xiaoping. Este queria relançar as reformas após os trágicos
eventos da praça Tiananmen (Pequim), ocorridos em 1989.
Em 1999, a Constituição chinesa
recebeu emendas e passou a admitir que o setor privado era um
"componente importante" da
economia nacional. Até então, ele
era considerado um "complemento" do setor público.
Agora os empresários recebem
o direito de aderir ao PC, um
apoio oficial que deve dar à classe
empresarial chinesa mais prestígio. Por outro lado, vale lembrar
que, no setor privado chinês, não
há direitos sociais nem trabalhistas. Além disso, os métodos contábeis são pouco (ou nada) confiáveis, o nepotismo domina, a
corrupção reina, e o nível educacional dos patrões é baixo.
Isso, aliás, também está mudando, pois a nova geração de empresários tem ótima formação, incluindo um grande número de diplomas obtidos em universidades
americanas e européias.
Quanto à cúpula do PC, segundo analistas, seu objetivo é inserir
os empresários no partido para
tentar controlá-los. Pequim teme
que, no futuro, eles venham a representar uma fonte de divergência política. Trata-se, portanto, de
uma tentativa de neutralizá-los,
de acordo com os especialistas.
Mas, para os "capitalistas", chegou o momento da reabilitação.
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