São Paulo, domingo, 15 de novembro de 2009

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"Israelense, iraniano e palestino quiseram vir"

Amorim diz que interesse nas visitas partiu dos líderes do Oriente Médio

Chanceler afirma não ver isolamento internacional do Irã e descarta "infiltração" do país na América Latina, o que é denunciado por Israel

DA COLUNISTA DA FOLHA

Neste trecho da entrevista, Celso Amorim avalia a aproximação do Brasil do Oriente Médio, evidenciada pelas visitas dos líderes israelense, iraniano e palestino ao país. (EC)

 

FOLHA - O Brasil vê algum avanço nas negociações do Oriente Médio com a troca de Bush por Obama?
AMORIM - Para falar a verdade, não temos visto avanços, não. Pelo contrário, o anúncio da renúncia de Mahmoud Abbas [presidente da Autoridade Nacional Palestina, de buscar a reeleição] é sinal de fadiga de alguns líderes que estão perseguindo justamente a linha pacífica e do diálogo.

FOLHA - Qual a pretensão do Brasil ao receber no mesmo mês Shimon Peres (Israel), Mahmoud Abbas e Mahmoud Ahmadinejad (Irã)?
AMORIM - Não se trata de pretensão. Eles têm interesse em vir porque acham que o Brasil pode ter um papel no Oriente Médio. E há também interesses bilaterais. O nosso comércio com Israel passou de US$ 1 bilhão, e eles têm interesse inclusive na área aeronáutica. Com o Irã, chegou a US$ 2 bilhões, antes de cair, porque todos caíram com a crise. No caso da Autoridade Nacional Palestina, o interesse comercial é modesto, mas queremos ter boas relações com eles, queremos ajudá-los.

FOLHA - Como o Brasil, tão longe, fora do eixo de poder, pode se meter no Oriente Médio?
AMORIM - Tem de perguntar para eles, porque eles é que vieram aqui. Se o Brasil estivesse dando uma de oferecido, nem ia ser recebido tão bem. Eles diriam "bye bye, tchau", não precisariam estar se deslocando para discutir, entre outras coisas, o Oriente Médio. O Brasil é um país grande, com peso no sistema multilateral, e há também a figura do presidente Lula, que é visto como conciliador, tem carisma.

FOLHA - O que o Brasil lucra recebendo o presidente do Irã, que sofre isolamento internacional e fortes reações internas?
AMORIM - Não vejo nenhum isolamento internacional. Ao contrário, pela primeira vez, os americanos estão sentando à mesa com os iranianos, inclusive para debate nuclear. Quanto às questões internas, não nos cabe fazer nenhum juízo de valor sobre o presidente do Irã. Eles têm muito interesse na área de energia, do biocombustível a hidrelétricas, e nós, na área de alimentos, de agricultura, de cooperação. E podemos conversar sobre vários temas internacionais, sobretudo sobre o Oriente Médio mesmo. O Irã é um ator importante na região, com 80 milhões de habitantes e uma história grande. Não é uma questão que dependa de a pessoa gostar ou não.

FOLHA - Como dialogar com Ahmadinejad sobre a região, após ele pregar "varrer Israel do mapa"?
AMORIM - As pessoas mudam. Podem notar que tais afirmações não beneficiam seu país.

FOLHA - O governo monitora as manifestações contra ele, no dia 23?
AMORIM - Não sei de nada. A única coisa que vi foi uma faixa lá no Rio que deduzi ser do movimento gay, e acho muito bom. O Brasil é uma democracia, todos têm direito a se manifestar.

FOLHA - Já Israel diz que há uma "infiltração iraniana" na América do Sul, a partir da Venezuela.
AMORIM - É que as pessoas precisam viver sempre com um pesadelo. Antigamente, era a infiltração soviética. Agora, como não existe mais URSS, é o iraniano, não sei mais quem. Nada disso tem procedência nem ameaça o Brasil.


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