São Paulo, quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Indonésia assiste à agonia do ex-ditador Suharto

Corrupção, massacres e crescimento econômico caracterizam 32 anos de regime

Responsável pela morte de 500 mil, Suharto, 86, resiste a septicemia e falência dos órgãos; mausoléu está pronto na ilha de Java

SETH MYDANS
DO "NEW YORK TIMES", EM SOLO, INDONÉSIA

A tumba está pronta, em um mausoléu no pico de uma pequena montanha no centro da ilha de Java, cercado de plantações de arroz e não muito distante de um retiro sagrado ao qual o ex-presidente Suharto costumava vir para meditar. Nos últimos 12 dias, em um hospital de Jacarta, o coração, pulmões e rins de Suharto -o uso de nome único é comum na Indonésia- entraram em colapso, e o país que ele um dia dominou acompanha com interesse seu esforço para viver.
Os médicos apresentaram diversos relatórios - "deterioração", "muito crítico" - e a família correu por diversas vezes para estar com ele no momento final. Na manhã de anteontem, ele parecia estar se recuperando uma vez mais. Hoje, os médicos anunciaram que Suharto está com septicemia. Suharto, 86, alterna momentos de consciência e inconsciência, e está se apegando à vida de maneira mais tenaz do que se apegou ao poder em maio de 1998, quando foi informado pelas Forças Armadas que era hora de deixar o posto, após um colapso econômico e tumultos generalizados.
O país conduziu eleições democráticas e não faz esforços para levá-lo à Justiça pelos casos de corrupção e violações de direitos humanos em seus 32 anos como presidente. Em jornais e em declarações de funcionários do governo, há um clima de perdão, ou ao menos de decoro. "As realizações e obras que ele conduziu não foram poucas, mesmo que como ser humano, a exemplo de outros líderes, tivesse algumas deficiências", disse o presidente Susilo Bambang Yudhoyono, após antecipar o retorno de uma visita à Malásia para estar ao lado do predecessor.
O partido de Suharto pediu que o governo suspenda todos os casos contra ele, e algumas figuras públicas afirmaram que o país deveria esquecer o passado e se concentrar no futuro. No domingo, um velho amigo de Suharto, Lee Kuan Yew, o fundador de Cingapura, visitou-o em Jacarta. Lee afirmou que o legado de Suharto não estava sendo honrado como deveria. "Sim, ele fez favores à sua família e amigos, mas houve crescimento real", disse, aparentemente disposto a perdoar a atitude que jamais admitiu nos ministros de seu governo.
Suharto tomou o poder em um golpe militar em 1965, poucos anos depois de Ne Win ter feito o mesmo na Birmânia -atual Mianmar. "Comparem que país se saiu melhor", disse Lee. "Alguns bilhões de dólares em graves excessos não são tão importantes se comparados às centenas de bilhões de dólares em ativos que ele construiu." Aqui na cidade de Solo e na região rural vizinha, as pessoas dizem lembrar mais do crescimento do que da corrupção ou do governo repressivo, e tampouco do colapso econômico que marcou o fim de seu governo ou dos massacres que caracterizam seu início, com a morte de pelo menos 500 mil pessoas.
Os advogados de Suharto conseguiram evitar processos criminais, alegando que ele estava doente demais para ser julgado. Enquanto jazia no hospital, reportagens conflitantes informaram que seus seis ricos filhos negociavam para encerrar extrajudicialmente o único processo contra ele. O secretário da Justiça disse que Yudhoyono o instruiu a oferecer acordo em um caso que pede a restituição de US$ 1,4 bilhão supostamente roubado por meio de uma fundação de caridade. O presidente nega ter ordenado a oferta e disse que este não era o momento de falar a respeito.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


Texto Anterior: Quênia: Opositor é eleito presidente do Parlamento
Próximo Texto: Com promessa de emprego, Romney vence em Michigan
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.