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ANÁLISE
Vingança e humilhação ameaçam paz
do enviado especial a Pristina
Apesar do acordo de paz, Kosovo
ainda é um barril de pólvora. O
sentimento de vingança dos albaneses e a humilhação da retirada
sérvia ameaçam fazer correr mais
sangue na Província.
Os papéis devem se inverter agora. Com o fim da polícia sérvia, que
acabou oficialmente ontem, uma
nova força de segurança civil terá
de ser constituída.
O ELK (Exército de Libertação de
Kosovo), a guerrilha separatista,
está pronto para ceder parte significativa de seu contigente para essa
finalidade.
Os policiais e paramilitares sérvios, que fizeram o serviço mais
sujo na guerra, a partir de agora
são apenas civis. O novo policial
poderá "visitar" aquele que massacrou e matou seus familiares.
Se a Otan e a ONU, encarregada
de criar novas instituições civis em
Kosovo, falharem em dar segurança aos sérvios que ficaram, naturalmente se formará uma nova
"guerrilha".
Em Pristina, albaneses que trabalham com os jornalistas estrangeiros já temem franco-atiradores.
A humilhação sérvia é vísivel na
retirada dos soldados (abatidos e
contrariados) e no êxodo dos civis
para o norte. A "integridade territorial iugoslava" é uma ficção do
acordo de paz.
A Sérvia perdeu Kosovo. Quem
dá as cartas não é a ONU (Organização das Nações Unidas), como
diz o ditador Slobodan Milosevic
para mascarar sua derrota, apesar
de ter surpreendido a Otan.
Quem manda é a Otan, que travou uma guerra improvisada (deveria durar 2 semanas, mas durou
11), tomou uma rasteira na hora da
"photo op" (os russos foram as
primeiras forças de paz a chegar a
Pristina), mas ocupa competentemente o território kosovar.
O problema é que não basta o superpoder da maior máquina militar do planeta para acabar com o
ódio racial em Kosovo.
Uma "paz artificial" não demorará a ser quebrada se extremistas
dos dois lados voltarem a se enfrentar.
Outro fator de desestabilização é
a crise econômica que atinge a Sérvia por quase dez anos.
Sem ajuda financeira das potências ocidentais a Belgrado, o alto
desemprego (1,6 milhão dos cerca
de 8 milhões de habitantes, segundo o governo) e refugiados (400
mil da Guerra da Bósnia e os que
estão deixando Kosovo agora) podem dar combustível para a subida
ao poder de extremistas.
Vojislav Seselj, que anunciou sua
saída do governo, é líder do SRS
(Partido Radical da Sérvia) e parece apostar no declínio de Milosevic. É mais nacionalista, ao menos
na retórica, do que o ditador.
Em Kosovo, além da recomposição econômica (a infra-estrutura
está completamente devastada), a
ONU e a Otan têm a missão de "ensinar" tolerância aos albaneses,
para que não repitam a violência
da qual foram vítimas.
É compreensível a sede de vingança da população que sofreu
uma cruel limpeza étnica, cujas
evidências de atrocidades são cada
vez maiores.
No entanto, o Ocidente deve
prestigiar lideranças pacifistas, como o kosovar de etnia albanesa
Ibrahim Rugova, aos extremistas
do ELK.
Ontem, tropas da Otan prenderam pela primeira vez soldados da
guerrilha.
Esse ato soou como uma resposta clara ao clamor sérvio por proteção. Na mesma tarde, o congressista Vojislav Vukcevic, enviado a
Pristina de pelo líder sérvio moderado Vuk Draskovic (liderança
mais simpática aos ocidentais e vice-versa), fazia um apelo.
"Peço ao povo sérvio que continue aqui, onde já vive por 13 séculos. Já resistiu à dominação do Império Otomano (por mais de cinco
séculos) e pode fazê-lo agora. Se
não proteger os sérvios, as Nações
Unidas e a Otan terão falhado no
cumprimento de sua missão em
Kosovo."
(KA)
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