São Paulo, quinta, 16 de julho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NOVA RÚSSIA
Parlamento começa votação de plano anticrise do governo; FMI quer projeto aprovado para fazer empréstimo
Oposição russa fala em "escravos do FMI'


JAIME SPITZCOVSKY
Editor de Exterior e Ciência

A Duma (câmara baixa do Parlamento russo) iniciou ontem a votação do plano anticrise econômica proposto pelo presidente Boris Ieltsin, uma das etapas mais delicadas do projeto governista para enfrentar anos sem crescimento econômico, a ameaça de desvalorização do rublo e o aumento da desconfiança dos investidores estrangeiros.
A oposição neocomunista, principal força na Duma, anunciou que não aprovará o plano de uma só vez. Vai examinar cada item e se diz preocupada com o "aumento da dependência do país" em relação ao capital estrangeiro.
"Queremos saber se a Rússia está se escravizando ou não", disse o líder da bancada neocomunista, Guennadi Ziuganov. Seus aliados, no entanto, já aprovaram alguns pontos do acordo, e a votação pode se estender até amanhã. O Kremlin alimenta a expectativa de que os principais itens serão referendados.
Na segunda-feira, a Rússia fechou um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e com o Banco Mundial que significa uma injeção de US$ 22,6 bilhões, em dois anos, na economia do país. O anúncio dos empréstimos trouxe, no dia seguinte, uma onda de otimismo refletida na alta de 17% na Bolsa de Moscou.
Mas os credores internacionais condicionam a abertura dos cofres à adoção do plano anticrise, que busca diminuir os déficits nas contas do governo.
O Kremlin tem de aumentar sua arrecadação fiscal. Com esse objetivo, e na tentativa de conseguir crescimento econômico, o governo pretende deslocar o peso maior dos impostos das empresas para os ombros do consumidor.
A estratégia ieltsinista prevê também aperfeiçoar seu sistema de cobrança de impostos. A baixa arrecadação (apenas 5 milhões dos 147 milhões de habitantes pagaram suas taxas em 97) revela fraqueza das novas instituições governamentais, ainda pouco enraizadas.
O problema também evidencia uma questão cultural. Os russos praticamente desconheciam a prática de pagar impostos durante a era soviética, terminada em 1991.

Mais receita
O pacote anticrise, com as mudanças no imposto de renda, representa um aumento na arrecadação de mais de 20 bilhões de rublos (US$ 3,2 bilhões) por ano, segundo Anatoli Tchubais, principal negociador russo junto ao FMI e ao Banco Mundial.
Tchubais disse que a Rússia deve amargar mais um ano sem crescimento econômico, tendência verificada desde o fim do período soviético. O ano passado representou uma exceção: a economia russa cresceu 0,4%.
No mesmo período, a China, por exemplo, registrou um crescimento econômico de 8,8%. Pequim consegue uma transição à economia de mercado menos turbulenta.
Guennadi Ziuganov indicou que sua bancada pode apoiar partes do plano anticrise. "Mas temos de pensar no preço que isso vai custar às futuras gerações", afirmou. "Queremos conhecer em detalhes as condições do FMI."
Nos últimos dias, Ziuganov diminuiu a intensidade de suas declarações pró-impeachment de Ieltsin. Parece preocupado com a possibilidade de explosão de conflitos sociais.
Protestos contra o governo continuam. Há mais de um mês, trabalhadores de empresas estatais, com salários atrasados, fazem protestos diários no centro de Moscou.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.