São Paulo, domingo, 16 de agosto de 1998

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MULTIMÍDIA
Japão já tem os "cansados" de Hiroshima

The Independent

de Londres

RICHARD LLOYD PARRY
em Tóquio

A cidade de Hiroshima, 53 anos depois de se tornar a primeira vítima de uma bomba atômica, se orgulha de nunca esquecer. Todo ano, centenas de milhares de visitantes passam pelas aflitivas exibições do famoso museu da bomba.
Diversos prefeitos e sobreviventes do ataque atômico viajaram ao redor de todo o mundo divulgando mensagens de paz e fazendo campanha pelo desarmamento.
Mas nem todos estão satisfeitos em viver na autodenominada "cidade da paz": este ano, as autoridades de Hiroshima se viram sob crescente pressão para interromper "as celebrações" e superar o episódio da bomba atômica.
Na quarta-feira, a polícia da cidade prendeu um homem por um raro caso de incêndio. Um semana antes, às vésperas do aniversário da bomba, ele teria colocado fogo em uma pilha de aves origami, colocadas no Parque da Paz. As aves de papel são feitas por crianças como homenagem aos jovens que morreram na explosão ou em consequência da radiação.
No dia seguinte, a Prefeitura de Hiroshima admitiu ter recebido dúzias de reclamações relacionadas ao aniversário da bomba, em 6 de agosto, quando toda a cidade fecha para lembrar o ataque. Cidadãos enfurecidos ligaram para os órgãos governamentais reclamando que eles estariam fechados e perguntado se seu lixo seria recolhido naquele dia. "Por quanto tempo continuaremos com isso?", perguntou um dos moradores de Hiroshima. "Mais de 50 anos é o suficiente."
Alguns atos de crueldade cínica foram relatados pelos "kataribe" ou "contadores de histórias" -sobreviventes do bombardeio que visitam escolas para contar suas memórias.
No último ano, diversos "kataribe'' disseram ter sido insultados por estudantes que menosprezaram suas experiências e destilaram expressões sarcásticas de horror diante de seus relatos.
Um dos sobreviventes, Tsukasa Watanabe, foi atingido por doces. "Essa foi a pior experiência que eu já tive como "kataribe'", disse. "Eu não pude evitar chorar de frustração e raiva."
Um estudante escreveu em um ensaio sobre os ""kataribe'': "Os sobreviventes me fazem pensar se eles têm algum tipo de satisfação narcisística ao representarem suas novelas enlatadas".
Mas uma controvérsia séria sempre envolveu cerimônias pela guerra. Enfurecendo os governos chinês e coreano, o governo japonês homenageia o túmulo de Yasukuni, que glorifica as almas dos mortos na guerra, incluindo aí os criminosos de guerra.


Tradução de Rodrigo Castro




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