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Unasul continua sem consenso sobre bases
Bogotá se nega a dar garantias formais cobradas por vizinhos em reunião de chanceleres e ministros da Defesa, em Quito
"A Colômbia não percebe o incômodo que isso causa nos outros países e não procura solucionar", desabafa Celso Amorim após novo fracasso
Dolores Ochoa/Associated Press
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O chanceler e o ministro da Defesa colombianos, Jaime Bermúdez e Gabriel Silva, ao lado dos colegas brasileiros Amorim e Jobim
SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A QUITO
Contrariando pressões dos
outros 11 países da Unasul
(União de Nações Sul-Americanas), a Colômbia rejeitou dar
garantias por escrito de que as
bases militares cujo acesso facultará a forças americanas não
servirão para atacar outros países, o que levou ao fracasso a
reunião de chanceleres e ministros de Defesa da região convocada para debater o tema.
O encontro, realizado ontem
em Quito sob os auspícios da
presidência pro-tempore equatoriana da Unasul, não teve comunicado final e nem sequer
resultou na promessa de um
novo encontro para debater as
preocupações militares.
A reunião também evidenciou o isolamento regional da
Colômbia, criticada por apostar todas as suas fichas geopolíticas na parceria com Washington, vista pela maioria dos colombianos como ferramenta
crucial no combate ao narcotráfico e às Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) -que protagonizam uma
guerra civil desde os anos 60.
A delegação colombiana resistiu até o final aos pedidos por
garantias formais sobre a natureza da presença militar americana, cobradas com especial
firmeza pelo chanceler brasileiro, Celso Amorim. A comitiva também se recusou a mostrar cópia do pacto firmado
com os EUA, que desperta o espectro do intervencionismo
americano no hemisfério.
Nos últimos minutos do encontro, que se estendeu das 9h
às 18h no salão de um hotel de
luxo em Quito, a Colômbia
mostrou-se disposta a dar aos
céticos algum tipo de garantias,
desde que a declaração final
não as tratasse como "formais".
Não houve acordo, e a reunião
foi encerrada, em meio ao cansaço e à constatação geral do tamanho do impasse sobre o tema, discutido já em cúpulas
presidenciais da Unasul na própria Quito e em Bariloche (Argentina), no mês passado, antes
da reunião extraordinária de
ontem.
O chanceler Celso Amorim
deixou clara, em conversa com
a Folha e outro jornal, a sua
avaliação da reunião.
"A questão das garantias espelha uma resistência da Colômbia em ter uma posição totalmente aberta e transparente
com a região. Ela terá suas razões, não quero [detalhá-las],
mas isso torna difícil chegarmos a um consenso", disse
Amorim, que estava acompanhado do ministro Nelson Jobim, da Defesa, que em visita a
Bogotá no mês passado dissera
à Folha ter recebido a promessa das autoridades colombianas de que dariam as garantias.
Transparência
Amorim também criticou a
malsucedida estratégia da Colômbia, que consistiu em desviar o foco das bases e incluir na
agenda discussões sobre dois
acordos de defesa que ela considera controversos: de um lado, a parceria com a França que
permitirá ao Brasil comprar
helicópteros e construir um
submarino nuclear, além de
negociar a aquisição de caças de
última geração; do outro, a
compra de sistemas de mísseis,
tanques e helicópteros russos
pela Venezuela.
"[Os colombianos] falaram
em corrida armamentista. Mas
não temos nenhuma dificuldade em mostrar tudo. A presença estrangeira em território de
um país sul-americano é diferente da compra de armas", insistiu o chanceler brasileiro,
que disse nunca terem sido
questionadas as compras de
equipamento militar por Chile
e Peru, entre outros exemplos.
Amorim frisou que os países
sul-americanos muitas vezes
avalizaram apelos colombianos
para condenar o narcoterrorismo, e, num tom inabitual para
um chanceler, afirmou: "Temos um problema muito sério,
não só pela questão das bases. A
Colômbia não percebe o incômodo que isso causa nos outros
países e não procura solucionar
[a questão]".
A impressão foi reforçada pelo chanceler boliviano, David
Choquehuanca. "Lamentavelmente não conseguimos alcançar soluções. Lamentamos a
atitude e a intransigência da
Colômbia, que não quer ser
transparente no convênio sobre as bases militares."
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