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São Paulo, quinta-feira, 16 de outubro de 2003

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VIZINHO EM CRISE

Brasileiro e Kirchner devem condenar hoje oposição e governo

Insatisfeito com presidente, Lula diz que apóia a Bolívia

Carlos Barria/ Reuters
Bolivianos acompanham discurso de líder sindical, em La Paz


ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

GABRIELA ATHIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, por meio de seu porta-voz, André Singer, que o Brasil está à disposição para ajudar a Bolívia a encontrar uma saída pacífica para a crise política.
Numa sutileza diplomática, Lula não disse que está disposto a ajudar o presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, mas sim "os bolivianos", o que inclui a oposição.
"O Brasil está disposto a fazer tudo o que for considerado útil para ajudar os bolivianos a encontrar uma solução pacífica e legal para superar o mais rápido possível o atual momento de dificuldades", disse Singer, à noite. Até ontem, o Brasil não fora acionado para mediar o conflito. Se for, poderá participar.
A declaração foi feita depois do embarque de Lula para a Argentina. O governo Lula não apóia a tentativa de golpe, mas também não está nada satisfeito com o presidente Sánchez de Lozada, que é aliado incondicional dos Estados Unidos, foi responsabilizado pela violência que já gerou cerca de 70 mortes e tem poucas chances de manter o cargo.
Conforme a Folha apurou, a posição equidistante entre oposição e governo constitucional deverá ficar clara hoje nas manifestações de Lula e do presidente argentino, Néstor Kirchner, que se encontram em Buenos Aires. Eles devem condenar, igualmente, a oposição e o que consideram truculência na reação do governo.
Lula e Kirchner deverão lembrar a "cláusula democrática" do Mercosul, que prevê sanções, inclusive interrupção de cooperação, para países que desrespeitem normas básicas de democracia. A Bolívia é país associado do bloco.
Segundo o embaixador do Brasil em La Paz, Antonino Mena Gonçalves, "o Brasil aguarda que os dois lados [governo e oposição] abram canais de diálogo, mas o quadro negociador é muito confuso". Afirmou que "há intransigência de parte a parte e, como as facções de oposição não se entendem, não há interlocutores claramente estabelecidos".
A expectativa, até ontem, era a de que a Igreja Católica e a OEA (Organização dos Estados Americanos) entrassem como mediadores, tentando abrir o diálogo governo-oposição. "Apesar do enorme prestígio que o Brasil e o presidente [Lula] têm aqui, não houve pedido nem oferecimento para que o Brasil participasse desse esforço de negociação", disse o embaixador, por telefone.
Ainda ontem, o chanceler Celso Amorim disparou uma série de telefonemas a pedido de Lula. Falou com o secretário-geral da OEA, César Gaviria, com a chanceler da Espanha, Ana Palácios, e com o ex-presidente da Bolívia Jaime Paz Zamora, líder do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), partido que apóia Sanchéz de Lozada.
As posições do Brasil e dos Estados Unidos diante da crise da Bolívia têm sido inversas às que os dois países tiveram durante a tentativa de golpe na Venezuela, em 11 de abril do ano passado.
Os EUA rapidamente apoiaram o golpe liderado pelo empresário Pedro Carmona contra o presidente venezuelano, Hugo Chávez. Agora, apoiaram incondicionalmente o presidente boliviano Sánchez de Lozada -um velho aliado norte-americano, que morou e estudou nos EUA- e condenaram a oposição.
Já o Brasil fez diferente: na Venezuela, condenou radicalmente o golpe e apoiou o presidente constitucionalmente eleito. Na Bolívia, condenou tanto o golpe quanto a "violência" e o "elevado número de feridos e as perdas de vidas". Para o governo brasileiro, a violência é responsabilidade da reação oficial.
Para Mena Gonçalves, o país parecia "razoavelmente sob controle", mas havia sérias dificuldades de obter informação. Contou que, apesar da gravidade da situação, só um dos sete canais de TV transmitia noticiário sobre o que ocorria no país.

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