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Contrastes culturais e econômicos reforçam rixa
DA ENVIADA A SANTA CRUZ
A queda-de-braço entre os
governadores conservadores
de seis dos nove departamentos (Estados) bolivianos com o
governo do esquerdista Evo
Morales -responsável pela crise política que se arrasta desde
que o atual presidente assumiu
em 2006- torna-se ainda mais
complexa porque se alimenta
de sentimentos regionalistas,
diferenças culturais e assimetrias de desenvolvimento.
O discurso mais comum na
rica Santa Cruz, que lidera a
grita por autonomia administrativa em relação ao governo
nacional, é que o departamento
não deve se submeter aos desígnios e mudanças propostas
por Morales por ser o que exibe
os melhores resultados de desenvolvimento e produtividade
no país mais pobre da região.
Junto com os departamentos
de Tarija, Pando e Beni, os cruzenhos formam a chamada
"meia-lua", área de planícies e
selva que cerca, ao leste, o montanhoso resto do país. É de onde vem, atualmente, o grosso da
produção agropecuária. Concentra ainda, em Tarija e Santa
Cruz, a maior fonte de divisas
do país: petróleo e gás.
É nesses departamentos que
se registram os menores percentuais de pessoas que se declaram pertencentes a algum
dos 36 povos indígenas reconhecidos na Bolívia. Enquanto
no departamento de La Paz a
porção chega a 62% da população, em Santa Cruz é de apenas
22%, ajudando a formar um panorama em que a disputa política quase sempre resvala em
discursos racistas e deterministas (embora esse retrato seja
de 2001, data do último censo
nacional, e de lá para cá tenha
havido uma forte corrente migratória em direção ao oriente,
que deve se refletir em futuros
estudos demográficos).
Do outro lado, disputando e
equilibrando forças com o leste, estavam, até pouco o tempo,
as chamadas terras altas: Oruro, Potosí, Chuquisaca e Cochabamba, liderados por La Paz. A
região foi, durante muito tempo, a locomotiva do país, puxada pelo auge da mineração.
Na eleição de 2005, quando o
primeiro presidente indígena
foi eleito, foi também a primeira vez que as populações dos
departamentos votaram para
escolher seus governadores.
Das urnas emergiu uma situação politicamente complicada: dos nove departamentos,
em seis venceram opositores
de Morales, fazendo recrudescer a demanda histórica das autonomias regionais, agora com
declarada intenção de disputar
o centro de poder e os rumos do
país com La Paz.
Com novo papel na cena política, os governadores da meia-lua -que comandam 35% da
população total do país- fazem
agora o principal papel da oposição. São reforçados pelo governo oposicionista de Cochabamba -território ainda disputado por ser o berço do partido
governista e de Morales.
Mais recentemente, os oposicionistas avançaram ainda
sobre mais um flanco: a população do departamento de Chuquisaca, onde fica a cidade histórica de Sucre. Em 2005, os
chuquisaquenhos elegeram um
governador aliado de Morales.
Mas o vetor político do departamento mudou com a exigência de que Sucre fosse declarada capital plena -sede de todos
os Poderes- na nova Carta.
A Assembléia Constituinte,
cuja sede era em Sucre, parou
por conta da contenda, resultado da inabilidade dos constituintes do governista MAS
(Movimento ao Socialismo) e
da astúcia dos oposicionistas da
"meia-lua" para usar a situação.
Em um quadro já complexo,
abriu-se uma nova frente de
conflitos para Morales administrar: a disputa de sucrenhos
e pacenhos pela capital.
É nesse cenário que o presidente esquerdista deve levar
seu maior projeto -a nova
Constituição, com ampliação
dos direitos indígenas- a um
referendo no ano que vem.
(FM)
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