São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 2008

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Agressor de Bush vira herói local

EUA minimizam arremesso de sapatos contra presidente, cujo autor está preso sem acusação formal

Advogado de Saddam Hussein diz que há mais de cem colegas árabes dispostos a defender jornalista voluntariamente

Karim Kadim/Associated Press
Manifestantes mostram seus sapatos em passeata contra os Estados Unidos ontem em Bagdá

DA REDAÇÃO

"Juro por Alá: ele é um herói." O comentário, feito ontem pela irmã do jornalista iraquiano que lançou sapatos contra o presidente dos EUA, George W.
Bush na véspera, reflete a repercussão que o episódio recebeu -e não apenas no Iraque. As cenas de Muntader al Zaidi arremessando seus sapatos e chamando Bush de cachorro foi repetida pelas emissoras de TV árabes, enquanto fotografias do americano se esquivando ilustraram as primeiras páginas dos principais jornais da região.
"Uma excitação velada podia ser identificada em muitas reportagens, especialmente nos países em que o sentimento antiamericano é mais profundo", registrou o "New York Times". Na Líbia, um grupo de caridade liderado pela filha do chefe de Estado Muamar Gaddafi anunciou que dará ao jornalista um prêmio por coragem "porque o que ele fez representa uma vitória pelos direitos humanos ao redor do mundo". Nos EUA, a tática foi minimizar o caso, acusando o repórter de tentar chamar atenção. "Foi um incidente isolado. Põe em cena uma vontade particular", disse Robert Wood, porta-voz do Departamento de Estado.
A imediata libertação foi pedida numa passeata em Bagdá. Em Najaf, manifestantes lançaram sapatos contra uma patrulha dos EUA. O episódio motivou uma onda de solidariedade entre advogados. Jalil al Duleimi, defensor do ex-ditador Saddam Hussein, declarou: "Esse herói deve ter um julgamento justo, e já há mais de cem advogados árabes que se apresentaram como voluntários para defendê-lo".
Imediatamente detido após ter arremessado seus dois sapatos contra Bush, Zaidi segue sob custódia iraquiana sem acusação formal. Citando autoridades locais, o "Times" registrou que ele está sujeito a até sete anos de prisão, por cometer um ato agressivo a um chefe de Estado visitante. A publicação noticiou também que o jornalista foi agredido "severamente" por seus captores, que, além de privá-lo do contato com os familiares, ameaçaram seus irmãos.
Ele foi interrogado ontem, para saber se o protesto foi pago por terceiros, e submetido a testes para apurar se estava bêbado ou drogado ao ser detido. Além de lançar os sapatos, o repórter da emissora privada Al Baghdadiya bradou: "É seu beijo de despedida, cachorro. Isso é pelas viúvas, órfãos e pelos que foram mortos no Iraque".
Exortada pelo governo a se desculpar publicamente pelo episódio, a empresa ignorou o pedido e engrossou o coro das reivindicações por sua libertação. O sindicato dos jornalistas iraquianos condenou o ato, mas também cobrou a soltura.
A ofensa é a pior possível na cultura islâmica. Atingir alguém com sapato demonstra que o visado é tão desprezível quanto a sujeira sob a sola. Também considerado "impuro", o cachorro é um animal vedado aos muçulmanos.

Com agências internacionais

Assista ao vídeo de Bush se desviando dos sapatos
www.folha.com.br/083501



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