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Comércio e Justiça voltam à vida no Haiti
Fim de confrontos entre rebeldes e efetivo da ONU trouxe clima de maior estabilidade ao país, que agora planeja reformas
População haitiana ganhou coragem para denunciar integrantes de gangues, aponta o coordenador de
um projeto de segurança
LUIS KAWAGUTI
EM PORTO PRÍNCIPE
Sem confrontos entre rebeldes e militares das Nações Unidas há dois anos e 15 dias, o Haiti assiste atualmente a um ressurgimento do Poder Judiciário, do comércio de rua e da rede elétrica, além do início de
uma reforma carcerária.
No auge dos combates no
país, em 2005, os 1.200 militares brasileiros responsáveis pela segurança na capital Porto
Príncipe chegaram a entrar em
combate contra rebeldes chimères 111 vezes em seis meses,
o que dá a média de quase dois
confrontos a cada três dias.
A tropa brasileira chegou a
disparar 49,6 mil tiros (somente em combate) em cerca de 180
dias. Hoje, às vésperas do aniversário de cinco anos do início
da missão, é comum encontrar
soldados que chegaram ao Haiti e, em cinco meses de missão,
não usaram nem uma munição
do carregador do fuzil. As tropas brasileiras são substituídas
a cada seis meses.
Durante toda a missão, 25
militares morreram, sendo 3
deles brasileiros (dois em acidentes e um suicídio). Entre os
funcionários civis da ONU, as
mortes somaram 19.
Em meados de 2005, os capacetes azuis só conseguiam entrar nos bairros de Bel Air e Citè Soleil (redutos rebeldes) em
veículos blindados e sempre
eram recebidos a tiros.
Hoje, a primeira coisa que se
nota na capital é a ausência desses blindados, que agora só circulam à noite em áreas específicas. A maior parte do patrulhamento é feito por tropas em
jipes ou a pé, para não intimidar a população.
Vida noturna
Diferentemente de cinco
anos atrás, há grande movimento de veículos civis durante
a noite. Em um giro rápido de
carro é possível encontrar barreiras da polícia nacional nas
principais ruas.
A cidade, que vivia permanentemente sem luz, agora tem
energia elétrica na maioria dos
bairros entre o início da manhã
e as 19h. Lojas funcionam em
construções de alvenaria, e até
supermercados podem ser encontrados na cidade. Quando a
Minustah (Missão das Nações
Unidas para a Estabilização do
Haiti) teve início, o comércio
era realizado quase que apenas
em barracas de madeira semelhantes às dos camelôs.
Um mercado em ruínas no
centro de Citè Soleil -transformado em bastião da ONU para
a tomada militar da região em
2006- é hoje uma espécie de
símbolo da propaganda da pacificação do país. Ele foi reformado com verba norte-americana e transformado em delegacia. Além disso, o bairro teve
mais ruas asfaltadas e sua iluminação pública instalada.
As últimas facções rebeldes
que lutavam em Porto Príncipe
foram desbaratadas por operações militares da ONU em abril
de 2007.
"Ainda há membros de gangues em Bel Air e Citè Soleil,
mas são muito poucos e só
agem de noite. A grande diferença é que hoje a comunidade
tem coragem de procurar a polícia e denunciar", disse Mantinard Robert, coordenador de
um projeto de segurança comunitária em Bel Air promovido pela organização não governamental brasileira Viva Rio.
Reformas
Segundo a ONU, porém, a
continuidade da paz depende
de dois fatores: o treinamento
de um efetivo de 14 mil policiais
nativos -previsto para terminar até 2011- e a reestruturação dos sistemas judiciário e
prisional do país.
"A reforma do Judiciário é
mais complexa que a da polícia.
Temos um plano para que ela
seja concluída entre três e cinco anos", disse Luiz Carlos da
Costa, representante-adjunto
no Haiti do secretário-geral da
ONU, Ban Ki-moon.
Segundo Costa, os primeiros
passos já foram dados com a
aprovação de três leis, que tornam o Judiciário independente
do Executivo. Elas estabelecem
a criação de carreiras de magistrados, de um tribunal superior
e o estabelecimento de um processo de fiscalização das atividades judiciárias.
Além disso, neste ano, a escola de magistratura -fechada
desde a queda do ex-presidente
René Préval- foi reativada. A
meta da ONU é criar 160 novas
cortes e formar mais 350 juízes.
O sistema carcerário, em
contrapartida, teve poucos
avanços. Embora todos os presos políticos tenham sido libertados, a superlotação das cadeias fere padrões internacionais de direitos humanos.
Segundo relatório das Nações Unidas, cada um dos 8,2
mil presos dispõe hoje de 0,6
metros quadrados de área nas
17 prisões do país. O mínimo
estipulado pela organização é
2,5. Para diminuir o problema,
uma nova penitenciária com
mais 750 vagas está sendo
construída.
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