São Paulo, domingo, 17 de outubro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELEIÇÃO NOS EUA

Institutos de opinião usam margens de erro elevadas, que impedem análises precisas na disputa Bush-Kerry

Pesquisas pouco dizem sobre quem vencerá

LUCIANA COELHO
DE NOVA YORK

Tamanha é a avalanche de pesquisas despejada sobre os americanos nesta corrida presidencial que mal há espaço para questionar o que se lê. Mas, numa disputa tão acirrada como a de George W. Bush e John Kerry, é possível confiar em resultados com margens de erro tão amplas como a dos atuais levantamentos?
Na última sondagem para o canal CNN e o jornal "USA Today", feita nos dias 9 e 10 de outubro, o instituto Gallup entrevistou 793 prováveis eleitores. Kerry apareceu com 49% das intenções de voto, e Bush, com 48%.
Com a amostra tão reduzida, a margem de erro é de quatro pontos percentuais em ambas as direções -um intervalo total de oito pontos, no qual a vantagem de Kerry tem grande chance de inexistir. Em alguns levantamentos, o intervalo chega a dez pontos.
"Numa disputa acirrada como a dos EUA, uma pesquisa assim pode se tornar inútil. Que adianta mostrar um resultado apertado se você não pode mostrar quem está na frente?", diz Mauro Paulino, diretor do Datafolha.
A questão em jogo pode ser financeira. Quanto menor a margem de erro, mais entrevistas são necessárias e mais caro o levantamento -uma margem de erro de um ponto percentual demanda ao menos 6.000 entrevistas. E a opção da imprensa americana na atual disputa tem sido investir em um maior número de sondagens, em detrimento da precisão.
Além das pesquisas nacionais, há também uma enxurrada de pesquisas estaduais. Esses levantamentos são fundamentais, pois nos EUA a eleição é decidida no Colégio Eleitoral, e os delegados no colégio votam em bloco de acordo com o resultado da eleição popular em seu Estado.
"Normalmente, os resultados da pesquisa nacional e das estaduais estão atrelados -se a nacional mostra alguém dez pontos na frente, essa pessoa não vai perder no Colégio Eleitoral", diz Frank Newport, editor de pesquisas do Gallup. "Quando a disputa é acirrada, tal relação pode mudar. É por isso que estamos fazendo tanta pesquisa estadual."
Mas, pelas sondagens estaduais, o resultado também é nebuloso. Segundo a última série do Gallup, Bush tem 207 prováveis votos no Colégio Eleitoral, e Kerry, 213. Há ainda 118 em jogo, em Estados onde a disputa está empatada.
Outra zona cinzenta são as "tracking polls" (pesquisas de rastreamento). Trata-se de levantamentos divulgados diariamente que levam em conta os dados colhidos num período de três ou quatro dias.
Por exemplo: uma "tracking poll" divulgada na quinta-feira é feita com base em entrevistas colhidas de segunda a quarta; para o resultado divulgado na sexta, a pesquisa descarta as entrevistas feitas na segunda e acrescenta a opinião de novos eleitores, ouvidos na quinta -e assim sucessivamente. Seus defensores afirmam que elas permitem registrar mudanças no sentimento do eleitorado à medida que ocorrem.
"Numa eleição, principalmente com tanta exposição à propaganda, alguns eleitores podem mudar de idéia do dia para a noite", considera Newport.
O problema nesse caso é que o peso de um evento de impacto, como um debate, ocorrido durante o levantamento, é diluído.
O ataque mais recente à metodologia das pesquisas partiu de um dos principais jornalistas do país, Jimmy Breslin. Ele argumenta as pesquisas são feitas apenas por telefone e com aparelhos fixos, descartando a parcela da população que usa apenas celular.
Breslin e outros críticos dizem que boa parte da população jovem só usa o celular, porque fica pouco tempo em casa. É um público que nunca teve grande participação nas eleições (o voto nos EUA é facultativo), mas cuja posição pode ter mudado neste pleito, no qual foram batidos recordes de registros eleitorais.


Texto Anterior: Igrejas cristãs em Bagdá são alvo de bombas
Próximo Texto: Filho de Galbraith vê desastre econômico com Bush
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.