São Paulo, quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

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Racha no partido que derrubou apartheid cria nova legenda

Dissidência se diz "pós-racial" e adota retórica moderada; CNA é hegemônico na África do Sul desde o fim do regime racista

CNA faz evento paralelo contra recém-criada legenda; racha se arrasta desde a conferência do partido, no ano passado

DA REDAÇÃO

Dissidentes do Congresso Nacional Africano (CNA), partido hegemônico na África do Sul desde o final do apartheid, em 1994, lançaram ontem uma nova legenda. Liderado pelo ex-ministro da Defesa Mosiuoa Lekota, o Congresso do Povo (Cope, na sigla em inglês) consolida o racha na cúpula do CNA, cindida desde a derrota do então presidente Thabo Mbeki na disputa pelo controle do partido, em 2007.
"A história da África do Sul jamais será a mesma", disse ontem Lekota, no discurso de aceitação da presidência do Cope. Apresentado como alternativa para "todas as raças", o novo partido busca atrair os eleitores de classe média e empresários, receosos da influência da esquerda no CNA, sob liderança de Jacob Zuma, favorito à eleição presidencial de 2009.
Com apoio maciço de sindicatos, militantes e grupos de jovens, Zuma derrotou Mbeki na disputa pela liderança do CNA, em dezembro de 2007. Desgastado, Mbeki foi forçado a renunciar em setembro e Kgalema Motlanthe, alinhado a Zuma, assumiu interinamente a Presidência do mais rico país da África. Há um mês, os partidários de Mbeki anunciaram a criação do novo partido.
São "perdedores ressentidos", disse Zuma, insistindo ontem que o novo partido é "irrelevante" -ironicamente, o discurso foi feito em um evento paralelo na cidade universitária de Bloemfontein, convocado em reação ao lançamento oficial do Cope.
Uma derrota do CNA no pleito presidencial de 2009, que será realizado entre abril e junho, é considerada quase impossível. Mas o Cope pode levar a legenda a perder a maioria qualificada no Parlamento (2/3).
Antes mesmo de ser fundado, o partido dissidente demonstrou força nas eleições locais da Província do Cabo Ocidental, no início do mês. Concorrendo como independentes, políticos do Cope conquistaram assentos de dez distritos, contra três do CNA, que nunca teve grande popularidade na Província.
A legenda dissidente busca preservar sua associação histórica ao CNA, responsável pela queda do regime segregacionista. O primeiro nome escolhido, Congresso Nacional Sul-Africano, foi recusado por ser muito próximo ao do partido governista. O atual remete a um evento histórico realizado em 1955 pelo CNA e também foi questionado, mas a Suprema Corte autorizou o uso.

"Pós-racial"
O Cope, porém, se autointitula uma versão amadurecida da legenda, capaz de superar as divisões raciais e "oferecer um lar verdadeiro para todos os sul-africanos". Até ontem, o único grande partido de oposição era a Aliança Democrática, que reúne quase exclusivamente brancos e mestiços.
"Somos o partido do futuro", cantou ontem Lekota, puxando o coro que repetiu a frase nas 11 línguas oficiais sul-africanas. A alusão a Zuma, líder profundamente identificado com o povo zulu, era óbvia.
Em um ato visto como provocação pelos partidários de Zuma, Lekota cantara anteontem trechos de uma música folclórica dos descendentes de colonizadores, os africâneres, cuja língua caiu em desgraça política após o fim do regime racista.
A assinatura musical do ex-guerrilheiro Zuma é "Awulethe umshini wami" ("Tragam minha metralhadora", em zulu), Marselhesa da luta antiapartheid. Ao som da canção, entoada por opositores quando discursava, Mbeki caiu em desgraça na 52ª Conferência Nacional do CNA, em dezembro passado.

Com agências internacionais



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