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O IMPÉRIO VOTA
Cresce movimento apartidário contra o presidente; mulher pede no obituário contribuição para a campanha
Aversão a Bush forma frente anti-reeleição
LUCIANA COELHO
DA REDAÇÃO
Ainda sem adversário definido
para a eleição de novembro, o
presidente George W. Bush se tornou alvo de um turbilhão de campanhas apartidárias que visam
impedir sua reeleição -independentemente de quem o substitua.
A mais ostensiva dessas campanhas ganha palco depois de amanhã, no intervalo da transmissão
do Discurso sobre o Estado da
União proferido por Bush, e pode
ter uma reprise na noite do próximo domingo, em pleno Super
Bowl -a final do campeonato de
futebol americano.
É no intervalo comercial mais
caro da TV -e um dos de maior
audiência- que a organização
MoveOn, defensora do ativismo
político, pretende exibir o vencedor do concurso "Bush in 30 seconds" (Bush em 30 segundos),
que escolheu entre mais de 1.500
vídeos sobre o presidente Bush.
Todos negativos.
Para comprar os 30 nobres segundos em rede nacional, são necessários US$ 10 milhões (R$ 28,3
milhões). Até a tarde de ontem, a
organização já havia arrecadado
84% do valor.
"Durante os últimos três anos,
as políticas do presidente Bush
têm dilapidado o ambiente, colocado nossa segurança nacional
em risco, prejudicado nossa economia e redistribuído a renda da
classe média entre os conglomerados mais ricos do país", diz o
MoveOn em seu site ao apresentar o concurso. "Com a eleição de
2004 se aproximando, é crucial
que os eleitores entendam o que
as políticas do presidente Bush
realmente significam para o país.
E, para fazer isso, precisamos de
novos e criativos comerciais que
mostrem o que está em jogo."
Eleito por um júri estrelado que
inclui o documentarista Michael
Moore ("Tiros em Columbine"),
o cineasta Gus van Sant ("Elefante"), o ator Jack Black ("Alta Fidelidade") e os músicos Moby e Michael Stipe (do REM), entre outros, o vencedor foi Charlie Fischer, 38, um executivo de publicidade de Denver. Curiosamente,
Fischer já pertenceu ao partido de
Bush, o Republicano, antes de se
converter em democrata ("mudei
para melhor", diz).
As crianças pagam
A peça de Fisher, "Child's Pay"
(trocadilho com a expressão
"child's play", ou brincadeira de
criança, que pode ser livremente
traduzido como "as crianças pagam"), exibe uma série de imagens de crianças trabalhando duramente. No fim, surge a frase:
"Adivinhe quem pagará pelo déficit do presidente Bush".
A economia, diante do crescente déficit fiscal (na casa dos US$
400 bilhões) e suas amargas conseqüências, é uma das principais
frentes das campanhas anti-Bush.
A outra é a política externa, que,
para os oposicionistas, tem seu
maior expoente na Guerra do Iraque e seus 500 soldados americanos mortos.
As duas são o mote do financista húngaro George Soros, radicado nos EUA, em seu livro "A Bolha da Supremacia Americana",
recém-lançado nos EUA. Soros
doou US$ 12,5 milhões às campanhas contra a reeleição de Bush
-sendo a maior parte para o MoveOn e uma organização semelhante, a American Coming Together (América se unindo).
"Se reelegermos Bush, vamos
endossar a Doutrina Bush. A eleição de 2004 não é uma eleição
qualquer; ela é um referendo sobre a Doutrina Bush. O futuro do
mundo está pendente", declarou
Soros nesta semana durante o
lançamento do livro, em Washington. "Eu nunca me envolvi
com política, mas estou profundamente desconcertado com a direção que os EUA tomaram."
Polarização
Com dois grandes partidos se
alternando no poder, é natural
que a eleição presidencial americana tenha um histórico de polarização que beire o maniqueísmo.
Mas há tempos não se via um presidente despertar sentimentos
díspares com tamanha força.
Para o diretor do Instituto de
Política da Escola de Governo
John F. Kennedy (Universidade
Harvard), Daniel Glickman, a força que tomou o movimento anti-Bush provém de 2000.
Nas eleições daquele ano, Bush
perdeu de seu adversário, o democrata Al Gore, na votação popular. Mas os EUA utilizam o sistema de Colégio Eleitoral, para o
qual cada Estado envia um determinado número de delegados do
partido que venceu ali -e aí,
após a controversa contagem de
votos na Flórida, Bush venceu.
"O país esteve especialmente dividido, e por diferença mínima,
em 2002. Essa divisão parece não
ter mudado muito desde então",
disse Glickman à Folha. "Além
disso, embora o presidente Bush
em si seja popular, suas políticas
normalmente não o são."
A popularidade de Bush, que
em novembro ameaçava ficar
abaixo dos 50% pela primeira vez
desde o 11 de Setembro, ganhou
um impulso com a captura do ex-ditador iraquiano Saddam Hussein no mês passado e agora gira
em torno de 60%.
A tendência, segundo o analista
Thomas E. Mann, do Instituto
Brookings (Washington), é que a
popularidade do presidente retorne à casa dos 50% caso nada
excepcional aconteça.
"O percentual deve cair uma vez
que a lembrança da captura de
Saddam se esvaeça. Dificuldades
no Iraque, baixo índice de empregos e a polarização do eleitorado
devem tornar a eleição acirrada",
afirmou Mann à Folha.
Por outro lado, o especialista
não acredita que o dinheiro de Soros ou o ativismo do MoveOn
produzam grande efeito sobre as
chances do presidente. "Por ser
um grupo com base na internet, o
MoveOn é um ator novo e interessante na campanha, mas seus esforços devem ser reproduzidos
por grupos pró-Bush", afirmou.
"Quanto a Soros, ele está recebendo muita atenção por ser um bilionário-filantropo-celebridade,
mas o dinheiro que ele doou é
pouco em relação ao que Bush e
os republicanos vão arrecadar."
Reportagem do jornal "The
New York Times" publicada recentemente mostra que o presidente levantou US$ 130,8 milhões
durante 2003 em fundos para sua
reeleição. Os democratas, segundo seu site oficial, arrecadaram
US$ 42 milhões. Mas os números
podem mudar, quando o adversário de Bush for escolhido.
"O percurso para a nomeação
democrata [em julho] pulveriza o
partido temporariamente. Tão logo eles escolham seu candidato,
veremos uma rápida aglomeração em torno dessa pessoa. Afinal,
todos dividem a meta de derrotar
Bush, o que é mais importante do
que qualquer diferença pessoal",
explicou Glickman.
"Qualquer candidato democrata vai começar a corrida eleitoral
com um apoio entre 40% e 45% e
terá de se concentrar em conquistar essa margem entre 5% e 10%, o
que é possível, embora possa também ser difícil."
Esforços para conquistar esses
votos -ou para tirá-los de
Bush- não faltam. Morta em
agosto, Gertrude Jones, 81, deixou
claro em seu obituário, publicado
em um jornal de Kentucky: os que
comparecessem ao seu funeral
deveriam fazer doações "a qualquer organização que tente tirar o
presidente George W. Bush de seu
gabinete". Nada de flores.
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