São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

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Estupro de repórter vira rixa política nos EUA

Professor diz que, se ela não fosse branca, ninguém saberia do ataque; radialista ironiza vítima

ANDREA MURTA
DE WASHINGTON

O brutal episódio do espancamento e estupro por um grupo de egípcios da repórter da rede americana CBS Lara Logan virou febre na internet e assumiu contornos políticos e até racistas nos últimos dias nos EUA.
Cercada por 200 homens, Logan foi separada de sua equipe e atacada na sexta passada na praça Tahrir, no Cairo, onde cobria a queda do ditador Hosni Mubarak.
A reação mais polêmica até agora foi do repórter free-lancer e até então professor da prestigiada Universidade de Nova York Nir Rosen.
Em seu Twitter, ele disse que, já que Logan "estava para se tornar uma mártir glorificada, devemos nos lembrar de seu papel como grande "defensora de guerras" (...) Provavelmente, foi apalpada como milhares de outras".
Pouco depois, disse estar "revirando os olhos com a atenção que [Logan] vai receber" pelo estupro e que, se ela não fosse branca, ninguém ouviria falar do ataque.
Depois, Rosen se desculpou no Twitter, mas não foi suficiente. Ele se demitiu de seu posto na NYU e perdeu um emprego de consultor.
Não foi o único. Inúmeros blogueiros sugeriram que Logan foi culpada pelo ataque e assumiu o risco como mulher, "loira ainda por cima".
Outros usaram o episódio para criticar o Egito e os muçulmanos. Na Fox News, o apresentador de ultradireita Glenn Beck usou o estupro para justificar sua teoria de que o Egito cairia no caos.
A radialista e blogueira conservadora Debbie Schlussel foi além e disse que o ataque "aquecia seu coração".
"Não me incomoda nem um pouco que repórteres que dizem que muçulmanos e o islã são pacíficos recebam uma dose da "paz" real deles. (...) Espero que esteja gostando da revolução, Lara! Isso nunca aconteceu quando Mubarak tratava seu país de selvagens da única forma como podem ser controlados."
Muitos culpam a CBS por enviar Logan ao Egito no meio da tormenta. O blog GatewayPundit chegou a sugerir institucionalizar a discriminação, limitando a atuação de jornalistas mulheres a ambientes "seguros".
Acredita-se que respostas do tipo motivam as pouquíssimas denúncias de repórteres atacadas sexualmente.
Um artigo de 2007 publicado na revista de jornalismo da Universidade Columbia afirma que abusos são comuns em locais como zonas de guerras, mas mulheres temem falar a respeito por medo de ser consideradas mais fracas que colegas homens.
Mas o Comitê de Proteção de Jornalistas alerta que abusos contra repórteres e ativistas homens também são disseminados em vários lugares, como Irã e Paquistão.
O ataque a Logan jogou luz também sobre o preconceito sexual no Egito. Segundo pesquisa, 98% das estrangeiras e 83% das egípcias já sofreram assédio sexual.


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