São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 2006

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Microfone revela idéias de Bush para crise

Ignorando aparelho ligado, presidente dos EUA diz a Blair que situação no Líbano é "uma merda" e que deve enviar Rice

Em almoço durante cúpula do G8, americano acusa a Síria, critica a ONU e diz que Annan deve ligar para Assad para apaziguar Hizbollah

FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A SÃO PETERSBURGO

Um microfone ligado captou ontem o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush acusando a Síria e o Hizbollah de serem os responsáveis "por essa merda" que está acontecendo no Oriente Médio.
Bush também colocou em dúvida o papel e os métodos das Nações Unidas na atual crise e antecipou que sua secretária de Estado, Condoleezza Rice, poderia ser enviada à região do confronto "muito em breve".
Sentado à mesa de almoço durante a reunião do G8, em São Petersburgo, Bush conversava com o premiê britânico, Tony Blair, na mesma sala em que iriam também almoçar os governantes da Alemanha, França, Japão, Itália, Canadá, Reino Unido, Rússia e demais países convidados, entre eles o Brasil (que participou ao lado de outros emergentes).
Com Blair de pé ao seu lado, Bush falou enquanto mastigava um pedaço de pão. "Veja, a ironia é que o que eles precisam fazer é com que a Síria faça com que o Hizbollah pare de fazer essa merda, e está acabado."
O microfone estava na própria mesa ocupada por Bush, e a conversa foi captada pelo circuito interno de televisão, que deveria em princípio gravar apenas as imagens.
O comentário deixou claro que Bush acusa a Síria de estimular o Hizbollah a atacar Israel, e que só os sírios podem deter a ofensiva.
Bush também reclamou da postura do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, que pediu um imediato cessar-fogo entre Israel e o Hizbollah.
"Não gosto da seqüência disso. Sua atitude é basicamente pedir o cessar-fogo, e tudo o mais acontece...", disse Bush. Blair respondeu: "A coisa é complicada pois você não pode parar isso a não ser que tenha um acordo para uma presença internacional [na região]."
Um comunicado do G8 de domingo sugeriu a constituição de uma força internacional presente na fronteira entre Israel e Líbano, uma idéia que Blair passou a apoiar.
Bush disse que pensava em dizer a Annan para telefonar ao ditador sírio, Bashar al Assad, "para fazer alguma coisa acontecer". O presidente americano acrescentou que não culpava os governos de Israel ou do Líbano pelo conflito.
Bush também disse que pensava em enviar Condoleezza Rice para a região. Blair concordou e afirmou: "Certo, isso é o que importa. Veja, se ela for, ela deve ter sucesso onde eu só poderia chegar e falar".

"Obrigado pelo suéter"
O microfone também captou o comentário de Bush sobre um presente que recebeu de Blair.
"Obrigado pelo suéter. Foi incrivelmente simpático da sua parte. Sei que foi você quem o escolheu", disse Bush. "Oh, claro!", respondeu Blair.
Segundo depois, enquanto rodeava a cadeira de Bush, Blair percebeu que o microfone estava ligado e o desligou com um movimento brusco.

Trombada com Chirac
Além da reserva em relação ao papel da ONU no atual conflito, os EUA também trombaram ontem com a França sobre o melhor caminho para tentar resolver a situação.
O presidente francês, Jacques Chirac, que já havia discordado dos EUA ao qualificar de "excessiva" a reação israelense, afirmou que o que o G8 pediu em seu comunicado de domingo foi "um cessar-fogo imediato". "Isso está claro", disse Jacques Chirac.
Nicholas Burns, subsecretário de Estado dos EUA para Assuntos Políticos, negou essa posição: "Não houve nenhum pedido de cessar-fogo", afirmou, ao ser confrontado por jornalistas sobre a posição francesa.
No último dia da reunião do G8, seus líderes também exortaram a Coréia do Norte a interromper seus testes de lançamento de mísseis e a abandonar seu programa nuclear.
Sobre as ambições nucleares do Irã, os governantes concordaram em manter a pressão sobre aquele país por meio das Nações Unidas, com a possibilidade de fortes sanções.


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