São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 2008

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Para analistas, casal Kirchner buscou derrota

DE BUENOS AIRES

A maior derrota política da história do casal Kirchner, imposta pelo voto opositor do vice-presidente Julio Cobos ontem, é vista por analistas e pela imprensa argentina como o ápice de um conflito com o setor agropecuário em que, por quatro meses, o governo não conseguiu abrir diálogos nem alcançar consensos. Pelo contrário, afastou aliados, conseguiu a proeza de reunir uma oposição fragmentada e aproximou governistas e opositores.
"Ainda que a oposição seja pequena, pela primeira vez forma um bloco racional, articulado. E se aproximam dela os políticos governistas, ante o medo de que os votos que receberam lhes dêem as costas no futuro se seguirem a ordem autista que vem de cima em vez de brigar pelos seus representados", escreveu o historiador Marcos Aguinis na revista "Noticias", antes da votação no Senado.
A crise poderia ter sido evitada, ou ao menos minimizada, se o governo não tivesse respondido aos locautes do campo com discursos duros e ataques. O governo, que antes tinha maioria ampla no Congresso, foi acusado de comprar votos para garantir a aprovação do projeto na Câmara por apenas sete votos. Diante da crise, ganhar por pouco no Senado já era quase uma derrota. Perder, como disse o líder situacionista no Senado, seria uma "ferida de morte".
"Julio Cobos não foi um verdugo oportunista, mas a expressão definitiva de uma crise que havia deixado o kirchnerismo sem apoio público, sem confiança social na economia, sem aliados e sem grande parte do peronismo", escreveu o analista político Joaquín Morales Solá no site do jornal "La Nación", para quem Cobos pôs fim a um estilo de governar com abuso de poder hegemônico.
"O casal presidencial argentino não sabe governar de outra maneira que não seja impondo sua própria vontade à política e à sociedade", afirmou.
Em entrevista a um canal de televisão local, o analista político Rosendo Fraga declarou que agora cabe aos Kirchner escolher usar o já chamado "fator Cobos" como "um instrumento de mudança" em sua maneira de governar ou então considerá-lo um traidor "e continuar no caminho da confrontação".
No governo do presidente Fernando de la Rúa (1999-2001), a perda de apoio no Congresso e a renúncia do vice-presidente foram fatores que instigaram uma crise que levou à sua queda e a uma das piores crises políticas e econômicas que a Argentina já viveu. Cabe ver agora como os Kirchner vão aceitar e se adaptar à possibilidade de perder.
(ADRIANA KÜCHLER)



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