São Paulo, sexta-feira, 18 de agosto de 2006

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Blair cria mais de 3.000 crimes em 9 anos

Oposição acusa governo de "populismo penal"; entre as novas infrações, está imitar guarda de trânsito

MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DE LONDRES

Endurecer o combate ao crime e às suas causas tem sido uma das principais plataformas do governo Tony Blair desde que assumiu o poder, em 1997. Mas a revelação, anteontem, de que o Partido Trabalhista aprovou 3.023 novas modalidades de crime em nove anos de governo -quase uma ao dia- deu a dimensão do que os críticos chamam de "populismo penal".
Para a oposição, o governo "legisla antes e pensa depois", criando novas leis para cada ofensa potencial que ganha destaque nas manchetes. Do total de novas atividades tornadas ilegais, 1.169 foram aprovadas via legislação primária (debatida no Parlamento) e 1.854 por legislação secundária.
A quantidade de novas infrações criadas pelos trabalhistas é mais do que o dobro do total criado nos últimos nove anos de governo dos conservadores -tradicionalmente associados a uma postura mais rígida no combate à criminalidade.
Os números foram apresentados pelo porta-voz de assuntos nacionais do Partido Liberal-Democrata, Nick Clegg, pouco após a Associação de Chefes de Polícia do Reino Unido afirmar que pretende pedir ao governo poderes de "justiça instantânea" contra "comportamento anti-social".
"O legado dos nove anos de governo trabalhista é um frenesi de novas leis, uma obsessão com o controle de cada aspecto da vida cotidiana", disse Clegg.
O governo brande números positivos em resposta às críticas. "A taxa de criminalidade caiu 35% desde que o Partido Trabalhista chegou ao poder exatamente porque demos à polícia e ao sistema jurídico as leis modernas que eles precisavam", afirmou um porta-voz do governo. "Criamos leis para modernizar o combate aos crimes sexuais e à violência doméstica. Os liberais-democratas acham isso um erro?"
De fato, muitas das novas ofensas criminais foram aprovadas por consenso, mas boa parte delas é considerada prosaica, quando não inútil.
Entre as novas atividades que se tornaram ilegais estão imitar um guarda de trânsito e não deixar uma cópia da chave de casa com o vizinho, para o caso de o alarme disparar enquanto o morador estiver fora.

Mudança de mentalidade
Em seu discurso na convenção dos trabalhistas em setembro do ano passado, pouco após ter sido reeleito para seu terceiro mandato, Tony Blair indicou com ênfase o rigor que orienta sua política de segurança:"Nosso sistema jurídico parte do princípio de que seu dever é proteger os inocentes de serem injustamente condenados. É claro que isso deve ser a tarefa da Justiça, mas nossa prioridade é permitir aos que respeitam as leis viver em segurança".
Blair dividiu sua política de combate ao crime em três pilares: a "extensão radical" dos poderes da polícia para tomar decisões sumárias; o aumento dos policiais e o foco na juventude, "dando aos jovens o que fazer" e tirando-os das ruas.
Além de clamar por poderes de justiça sumária -sem julgamento em Corte- a Scotland Yard também tem defendido um tempo maior para manter presos suspeitos de terrorismo sem acusação formal.
A oposição afirma que tais movimentos poriam em risco as bases legais da nação. "Não podemos atropelar o sistema jurídico. É a Corte que deve analisar cada caso e tomar as decisões judiciais, não a polícia", afirmou David Davis, responsável pela Secretaria do Interior no Partido Conservador.


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