São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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ALEMANHA VOTA

Tradicionalmente afeitos ao consenso, patrões e empregados alemães se opõem quanto à natureza de mudanças

Para sindicatos, reforma é imprescindível

DO ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Sindicatos patronais e de trabalhadores alemães concordam que diversas reformas são imprescindíveis para dinamizar a economia do país. Todavia as medidas por eles preconizadas divergem radicalmente. Os primeiros privilegiam a flexibilização do mercado de trabalho, a redução das contribuições sociais etc. Os outros preferem um aumento das despesas públicas, visando dar o impulso primordial para que a economia volte a ter um crescimento sustentável e apostando no lado social da economia de mercado.
O antagonismo lembra um clássico debate acadêmico entre economistas favoráveis e contrários às políticas defendidas pelo britânico John Maynard Keynes (1883-1946) para combater a recessão. Na Alemanha atual, no entanto, a disputa opõe agentes socioeconômicos que, desde os anos 50, sempre procuraram soluções consensuais para suas diferenças: patrões e empregados.
Após o fim da Segunda Guerra, a economia social de mercado alemã -motivo de orgulho de sua população até pouco tempo atrás- encontra suas bases no tão decantado "modelo alemão", sistema no qual as classes patronal e trabalhadora, amparadas pelo governo e por bancos (muitas vezes, estatais), procuram chegar a soluções de compromisso para problemas que as afligem. Desde as últimas eleições legislativas, porém, o modelo vem sendo posto em xeque.
As pífias taxas de crescimento apresentadas pela Alemanha desde a década de 90 -exceto em 2000, quando foi de 3%- estão por trás da crise. Depois de três anos de crescimento quase inexistente, o total de riquezas produzidas no país aumentou apenas 1,6% em 2004.
Para o patronato, o número que faz soar o sinal de alarme é o de falências e de concordatas de empresas (sobretudo pequenas e médias): entre 25 mil e 35 mil em 2005, segundo projeções. Para a classe trabalhadora, por outro lado, o que incomoda é o desemprego, que atinge 4,7 milhões de pessoas. Ou seja, 11,4% da mão-de-obra ativa da Alemanha.
"Os níveis de desemprego, que se vêm mantendo elevados há quase uma década, não serão reduzidos se não houver importantes investimentos governamentais diretos em nossa economia", afirmou à Folha Markus Franz, porta-voz da Federação dos Sindicatos Alemães.
Para ele, o governo do social-democrata Gerhard Schröder aplicou políticas nefastas à economia, pois não privilegiou o poder de compra dos trabalhadores. Estes, segundo Franz, são os "agentes socioeconômicos que darão novo rumo à economia alemã por meio de suas despesas cotidianas, que serão mais altas e contribuirão para reduzir o desemprego se o poder aquisitivo da população for fortalecido". Contudo ele considera a alternativa eleitoral a Schröder, a conservadora Angela Merkel, ainda pior. "Seu programa econômico é socialmente injusto e continuará a prejudicar a demanda interna. Na realidade, os trabalhadores não têm grandes opções eleitorais na Alemanha atual, pois sabemos que o Partido da Esquerda prega medidas que, embora sejam em parte positivas, não têm como bancar", disse.
Martina Helmerich, do IG Metall, um dos maiores sindicatos da Europa, vai mais longe. "A redução dos custos do trabalho proposta por Merkel só seria favorável aos empregadores. Precisamos de investimentos públicos para fortalecer a demanda interna e de menos "regras de mercado" vindas de Bruxelas", afirmou, aludindo às diretivas da União Européia sobre a flexibilização do mercado de trabalho.

Sindicatos patronais
Já para os empregadores, é necessário "aliviar os custos que pesam sobre as empresas, que constituem os verdadeiros agentes do crescimento" econômico. "Devemos aprofundar as reformas iniciadas por Schröder, que foram relevantes. O problema dos social-democratas é que eles até fizeram algumas reformas importantes, mas não souberam explicá-las à população", apontou Volker Treier, da Câmara de Comércio e de Indústria Alemã.
"Somos contrários ao aumento do imposto sobre o valor agregado proposto por Merkel, mas acreditamos que, no geral, suas propostas sejam mais adequadas à situação atual da Alemanha. Precisamos flexibilizar os mercados e reduzir seus custos se quisermos atrair investimentos externos", acrescentou Treier.
Já René Hagemann-Miksitis, da Federação das Indústrias Alemãs, ressaltou a necessidade de "investir em tecnologia de ponta para que a Alemanha continue sendo um dos Estados mais avançados" do planeta. "Se os custos ligados ao mercado de trabalho continuarem altos, nosso mercado interno continuará a encolher gradativamente, e não haverá como voltar atrás." (MÁRCIO SENNE DE MORAES)

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