|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Diálogo de surdos mostrou que grupo islâmico não pode mais ser ignorado
DO ENVIADO A TEL AVIV
Não havia uma cadeira para o
representante do Hamas na
conferência internacional sediada ontem pelo Egito, muito
menos no jantar oferecido pelo
governo de Israel aos principais
líderes europeus, em Jerusalém. Mesmo sem estar presente ou ser citado, porém, o grupo
fundamentalista foi, na prática,
parceiro do acordo de trégua
que os eventos celebraram.
No diálogo de surdos que os
líderes israelenses travaram
com o Hamas nas últimas semanas, seja por meio de mísseis
ou da intermediação, egípcia, o
grupo fundamentalista pode
contar com uma vitória, sob os
escombros do preço pago pela
população de Gaza: o reconhecimento de que é impossível ignorá-lo como interlocutor na
gerência (enquanto uma solução não é possível) do conflito.
"Ninguém faz um cessar-fogo com um fantasma", diz o psiquiatra e ativista político Eyad
Sarraj, uma das personalidades
mais respeitadas de Gaza. Ele
ironiza a recusa de Israel em
admitir que a trégua foi resultado de um entendimento com o
grupo fundamentalista. "O Hamas foi reconhecido, ainda que
indiretamente, e Israel tem que
aceitar esse fato."
Para o psiquiatra, que nas
eleições de 2006, vencidas pelo
Hamas, concorreu como uma
plataforma pacifista, Israel foi
pressionado pelo governo americano a suspender os bombardeios. Para ele, a pressão partiu
tanto da atual administração
como da iminente posse do novo presidente, na terça-feira.
"O fator Obama pesou, além da
pressão causada pela crise humanitária em Gaza", diz Sarraj.
O cientista político Avraham
Sela, especialista em assuntos
palestinos da Universidade de
Jerusalém e autor de um livro
sobre o Hamas, também acha
que o movimento extremista
poderá aproveitar o fato de ter
sobrevivido aos ataques e entrar numa fase de legitimação.
Ele diz que é difícil avaliar se
os objetivos de Israel foram alcançados, e que isso só será possível a médio prazo, segundo a
vontade e a capacidade do Hamas de se rearmar e disparar foguetes. Já do outro lado, como é
típico de uma guerra assimétrica
entre um Exército e um grupo
guerrilheiro, a história é outra.
"Basta que eles não levantem
a bandeira branca para poder
cantar vitória", diz Sela. "De
qualquer maneira eles já ganharam, pois o mundo entende hoje
que o Hamas é o único endereço
em Gaza. Se até essa ofensiva
tanto Israel, como europeus e
americanos, se recusavam a reconhecê-lo, agora ficou claro que
o Hamas passará por uma fase
de legitimação."
Para Sela, qualquer acordo terá que ser implementado com a
aprovação do Hamas, "seja por
meio do Egito ou de agências internacionais".
Entre os que ganharam, além
do Hamas, está o Egito.
"O Egito é um dos vencedores
desta guerra, pois conseguiu voltar ao centro da arena política",
diz o coronel da reserva Shaul
Arieli, que já foi comandante do
Exército israelense em Gaza. "O
primeiro estágio, que era o cessar-fogo, foi alcançado. Mas os
próximos serão mais complicados, sobretudo promover a reconciliação política entre os palestinos."
Texto Anterior: Hamas aceita trégua; Israel começa retirada Próximo Texto: Frase Índice
|