São Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004

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FRANÇA

Em documento, cerca de 8.000 intelectuais dizem que o governo conservador está prejudicando as artes e as pesquisas

Chirac é acusado de "guerra à inteligência"

MARK JOHN
DA REUTERS, EM PARIS

Cerca de 8.000 intelectuais, artistas e cientistas franceses acusaram o governo, ontem, de travar uma "guerra à inteligência" que, disseram, está prejudicando as artes, a ciência e as pesquisas.
O governo conservador francês, que enfrenta uma onda de greves antes das eleições regionais de março, não atribuiu importância ao desafio dos intelectuais.
Segundo o abaixo-assinado publicado na revista "Les Inrockuptibles", o premiê Jean-Pierre Raffarin reduziu as verbas para a educação e as pesquisas públicas e golpeou o mundo das artes francesas, reduzindo os benefícios previdenciários disponíveis para artistas. "Essas áreas são alvos de um ataque maciço que revela uma nova forma de antiintelectualismo no interior do Estado. Estamos testemunhando uma política proposital", disseram os intelectuais na petição, intitulada "Apelo contra a guerra à inteligência".
Entre os signatários da petição estão o filósofo Jacques Derrida, os cineastas François Ozon e Catherine Breillat, o sociólogo Alain Touraine e alguns pensadores de esquerda como Daniel Cohn-Bendit, líder estudantil nos famosos protestos de 1968.
O rótulo de "intelectual" ainda é algo ostentado com orgulho na França, e os filósofos são presença regular nos programas de TV. O protesto dos intelectuais não parece representar uma ameaça real ao governo, mas pode prejudicar um pouco mais sua imagem antes das eleições regionais, que representam um teste de seu desempenho na metade do mandato.
O governo enfrenta pressão das greves de trabalhadores da saúde, de ferroviários e de eletricitários, justamente no momento em que procura promover reformas e enxugar seu déficit orçamentário.
Os cortes no Orçamento já levaram cerca de 5.000 cientistas a ameaçar com demissão em razão dos baixos salários e da redução de verbas para pesquisas, que, dizem, podem causar uma "fuga de cérebros" -transferência de pesquisadores para o exterior.
No ano passado, Raffarin, que cultiva uma imagem populista, despertou a ira dos atores quando reduziu seus benefícios sociais. Neste ano ele entrou em choque com os psicanalistas em torno de uma lei que regulamenta seu setor de atividade.

Desprezo
Durante um debate sobre a situação da França, em 2003, o premiê descreveu a intelligentsia, em tom de desprezo, como "a rolha de uma garrafa de champanhe, que tenta avaliar sua qualidade desde sua posição no alto".
"Há uma política de simplificação do debate público. Véu islâmico -contra ou a favor? Psiquiatra ou charlatão? Juiz de esquerda ou tira durão?", diz o abaixo-assinado, que acusa o governo de "emburrecimento".
O governo de Raffarin -no qual o chanceler, Dominique de Villepin, é poeta com obras publicadas, e o ministro da Educação, Luc Ferry, é filósofo formado- rejeitou as acusações.
"Acho que devemos evitar idéias simplistas e procurar não confundir questões distintas", disse o ministro da Cultura, Jean-Jacques Aillagon, à Reuters, após a reunião semanal do gabinete. "A impressão que se tem é que existe uma motivação política por trás disso."


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