São Paulo, terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

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Kosovo tem apoio de potências ocidentais

Mas independência da Província esbarra em resistência de aliados da Sérvia e de países que enfrentam separatismos

UE libera membros para interpretar lei internacional como lhes convier; na ONU, presidente sérvio diz que houve violação do direito

MARCELO NINIO
DE GENEBRA

Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha e Itália reconheceram ontem a soberania de Kosovo, um dia depois de a Província sérvia ter declarado sua independência. Embora o apoio das principais potências ocidentais dê um impulso fundamental para o novo país, a relutância de parte da comunidade internacional em fazer o mesmo indica que os desafios diplomáticos de Kosovo ainda estão longe de terminar.
O gesto do governo americano, já esperado, ocorreu na Tanzânia, onde o presidente George W. Bush está em visita oficial. Em um comunicado, a secretária de Estado, Condoleeza Rice, anunciou que o país havia aceito o pedido de Kosovo de estabelecer relações diplomáticas."Os Estados Unidos hoje reconheceram formalmente Kosovo como um Estado soberano e independente. Nós parabenizamos a população de Kosovo nesta ocasião histórica", disse Rice.
Numa resposta aos que, como a Rússia, condenaram a emancipação de Kosovo por considerar que ela pode gerar tensões separatistas em outras regiões, Rice disse que a história recente dos Bálcãs justifica o apoio americano ao ato unilateral e negou que ele signifique um precedente perigoso.
"À luz dos conflitos dos anos 90, a independência é a única opção viável para promover a estabilidade", afirmou.
No segundo dia de debates no Conselho de Segurança da ONU sobre o assunto, o presidente sérvio, Boris Tadic, pediu que a declaração de independência seja anulada. "O Estado sérvio nasceu em Kosovo, que representa parte central de nossa identidade", disse Tadic.
"Um país amante da paz, com um povo europeu orgulhoso, está tendo arrancada parte de sua identidade, tradição e história. Este ato anula a lei internacional, atropela a justiça e entroniza a injustiça."
Com os membros permanentes do Conselho de Segurança divididos -EUA, Reino Unido e França apoiando a soberania kosovar; Rússia e China contra-, a reunião mais uma vez acabou sem consenso.
Para a França, primeiro país a anunciar o reconhecimento, a independência de Kosovo representa o início de tempos melhores. "É o fim dos problemas nos Bálcãs", disse o ministro do Exterior, Bernard Kouchner. Reino Unido, Alemanha e Itália anunciaram que seguirão a França. Dentro da União Européia, persistiram as divergências.

Europa dividida
Durante uma reunião em Bruxelas, o bloco europeu tentou demonstrar unidade, mas não chegou a uma posição unânime. Pelo menos 20 dos 27 países do bloco indicaram que reconhecerão a soberania do território, um passo que Espanha, Grécia, Chipre, Romênia e Eslováquia por ora descartam.
Os chanceleres europeus adotaram uma proposta de consenso da Espanha, evitando discutir o princípio estabelecido pela independência de Kosovo, mas ressaltando que ela não serve de precedente para outros casos. O comunicado diz que cabe a cada país decidir como reagir à declaração de Kosovo segundo sua própria interpretação da lei internacional.
Alguns dos países que se opõem ao gesto têm seus próprios fantasmas secessionistas. A Espanha, por exemplo, está sob permanente alerta contra as demandas de separatistas do País Basco e da Catalunha. E o Chipre teme que a parte turca do país, que não tem reconhecimento internacional, possa ganhar legitimidade.
Apesar das divisões, a UE se prepara para enviar uma missão policial e administrativa com cerca de 2.000 pessoas a Kosovo. A missão irá substituir a equipe da ONU que administra a Província desde 1999, após a intervenção da Otan contra a repressão sérvia aos separatistas kosovares.
Preocupações semelhantes se estendem à Ásia, onde China, Indonésia e Sri Lanka criticaram o gesto de Kosovo. O governo chinês, que já ameaçou agir militarmente contra a independência de Taiwan, se disse preocupado com a estabilidade nos Bálcãs. "A China está preocupada com o grave e negativo impacto na estabilidade da região e na meta de estabelecer uma sociedade multiétnica em Kosovo", disse porta-voz.


Com agências internacionais


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