São Paulo, quarta-feira, 19 de março de 2008

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OEA agrada Quito, mas não discute tema de fronteiras

Resolução "rechaçou" bombardeio colombiano no Equador; EUA, para quem houve "legítima defesa", registraram ressalva

Reunião reabriu ataques e não houve acordo sobre fiscalização de fronteiras e cooperação; decisão ficou para encontro em junho

ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON

A reunião de chanceleres da OEA (Organização dos Estados Americanos) para ratificar o processo de paz entre a Colômbia e o Equador reabriu os ataques entre os dois países, não avançou nos termos políticos e não chegou a nenhum resultado prático, por falta de consenso. A questão foi empurrada para a Assembléia Geral da instância, em junho, em Medellín.
A resolução final foi lida à 1h10 (2h10 de Brasília) da madrugada de ontem, "rechaçando" o bombardeio colombiano contra as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) em território equatoriano; registrando o pedido de desculpas e o compromisso do país de não repeti-lo "em nenhuma circunstância"; e reiterando que todos os países se comprometem a combater "ações de grupos irregulares ou organizações criminais".
Houve uma guerra não só política, mas jurídica. O Equador e a maioria dos países defenderam e conseguiram a citação dos artigos 19 e 21 da Carta da OEA, que condenam a ingerência e a violação territorial em qualquer hipótese. Os EUA e a Colômbia tentaram, sem sucesso, "equilibrar" o texto incluindo o artigo 22 da Carta, que abre exceção para o caso de "legítima defesa".
Em horas e horas de debates, prevaleceu a versão -assumida pelo Brasil, por exemplo- de que o artigo 22 só é aplicado para um Estado se defender de outro, não para um Estado se proteger de um grupo ilegal (como as Farc) num outro país.
A delegação norte-americana foi discreta e deixou a linha de frente da guerra para a Colômbia, mas levou o que foi chamado de "um batalhão" de advogados e especialistas em direito internacional. No fim, com a resolução aprovada e aplaudida de pé, o embaixador norte-americano junto à OEA, Arthur Morales, apresentou em público e oralmente uma ressalva aos seus termos, defendendo o artigo 22 e o princípio da "legítima defesa". Foi o único a fazê-lo.

Sem acordo
De prático, a resolução limitou-se a "instruir" o secretário-geral da organização, José Miguel Insulza, a "exercer seus bons ofícios para a implementação de um mecanismo de observação do cumprimento desta resolução". Traduzindo, não chegaram a nenhum consenso sobre formas práticas para fiscalizar a fronteira entre Colômbia e Equador e evitar o livre trânsito das Farc. Não houve clima, muito menos, para discutir uma comissão militar permanente para a área.
A "instrução" a Insulza substituiu cinco propostas feitas pela comissão que investigou as circunstâncias do bombardeio colombiano. Em resumo, elas previam um mecanismo de observação dos países, não apenas de Insulza, e programas de cooperação e de diálogo. A Colômbia não aceita observadores no seu país, mas aceita nas fronteiras. O Equador não. A maioria dos representantes, inclusive o chanceler brasileiro, Celso Amorim, esforçou-se para se mostrar otimista. "Avançou mais um pouquinho.
É um bom precedente que estamos criando e que mostra a força da América Latina e do Caribe", disse Amorim, elogiando o fato de a OEA, com 34 países de todas as Américas, ter encampado a posição do Grupo do Rio, limitado à América Latina e ao Caribe e que tem um caráter político, não jurídico.
Para o chanceler, "não tinha sentido nenhum reforçar o pedido de desculpas da Colômbia e depois criar a ressalva da legítima defesa [para justificar ataques em outros países, como queriam EUA e a Colômbia]". Isso, para ele, "seria reverter todo o Grupo do Rio; não dá".
Entre tantas vozes, a do chanceler da Nicarágua, Samuel Santos López, foi a mais contundente. Em entrevista, ele lamentou "o regresso [das discussões] à fase antes do Grupo do Rio [quando foi selada a paz]" e acusou indiretamente a Colômbia de "querer andar para trás, retomando posições de força e acusando os nossos países de responsáveis pelas situações internas deles, que provocam todos esses problemas".


A jornalista ELIANE CANTANHÊDE viajou a Washington em um jato da FAB, a convite do Itamaraty


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