São Paulo, domingo, 19 de maio de 2002

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INTOLERÂNCIA NOS EUA

Islâmico continua o "suspeito de sempre"

Washington tenta melhorar relação com a comunidade, mas casos de discriminação se multiplicam

SUSAN SACHS
DO "THE NEW YORK TIMES"

O governo americano procurou promover uma aproximação com os muçulmanos do país, mas os acontecimentos de 11 de setembro continuam a abalar decisivamente a vida dessa comunidade.
Agências de direitos civis têm sido inundadas de reclamações sobre empregadores que discriminam abertamente os islâmicos desde os atentados, classificando-os de terroristas.
Em alguns casos, demitem funcionários muçulmanos exclusivamente em razão de suas origens religiosas ou nacionais.
Muitos dizem se sentir vítimas de uma silenciosa mas persistente discriminação nas atividades sociais cotidianas. Um conhecido outrora amigável agora não mais cumprimenta. Uma crianças é provocada seguidamente por seu nome árabe. Um freguês telefona para a polícia sugerindo que um comerciante de aparência estrangeira seria terrorista.
"Será que, sendo muçulmanos, estaremos sempre sob suspeita?", indaga Mansoor Khan, médico nascido no Paquistão que dirige o Help & Hope (ajuda e esperança), grupo de apoio a imigrantes muçulmanos de Nova York. "Será que sempre teremos de temer que alguém venha bater em nossas portas?"
Pesquisa nacional do instituto Zogby em março de 2000 apontou que 35% dos muçulmanos americanos diziam já ter sido discriminados por sua religião. À época, 39% dos árabes americanos afirmavam sofrer preconceito por sua origem étnica.
Esses números dispararam depois do 11 de setembro: em sondagem semelhante em novembro de 2001, 57% dos muçulmanos do país responderam acreditar que os americanos possuem opinião desfavorável sobre muçulmanos e árabes.
"Sentimos agora uma sensação de insegurança, uma sensação que não posso descrever em palavras", disse Zaheer Sharaf, dono de mercearia que chegou do Paquistão há seis anos.
Seu desconforto aumentou há quatro meses, quando parentes seus paquistaneses que o visitavam decidiram tirar fotos em frente ao seu estabelecimento. Alguém que viu a cena chamou a polícia, relatando a presença de estrangeiros suspeitos com câmeras fotográficas.
"A polícia veio à loja, e eu expliquei a situação. Eles foram legais, mas me senti muito constrangido. Gostaria de fazer parte da sociedade aqui, mas coisas pequenas como essa me fazem sentir excluído", afirmou Sharaf.
Houve esforços de celebridades e autoridades públicas para promover a tolerância religiosa. Apesar de uma onda de ataques contra entidades islâmicas pouco após o 11 de setembro, não se chegou ao ponto de uma ampla explosão de ódio e vingança. Voluntários se dispuseram a proteger mesquitas e a acompanhar muçulmanas que tinham medo de sair de casa.
Ao mesmo tempo, sob a bandeira do combate ao terrorismo, o governo lançou os holofotes sobre os muçulmanos, abordando-os em suas investigações e em seus interrogatórios.
Além dos mil homens presos numa varredura policial inicial, 5.000 jovens muçulmanos no país com vistos de turista ou estudante foram convocados para entrevistas pelo FBI.
O Departamento da Justiça também listou nomes de 5.000 imigrantes muçulmanos que não deixaram os EUA após receberem ordem de deportação -embora eles sejam apenas uma pequena fração do total de 320 mil pessoas de diversas origens que desrespeitaram ordens semelhantes.
O sinal mais claro da situação vivida pelos muçulmanos é o aumento nas reclamações às agências de direitos civis. Nos sete meses posteriores aos atentados, a Comissão para Oportunidades Iguais de Trabalho recebeu 427 reclamações sobre discriminação a islâmicos nos locais de trabalho, contra 171 no mesmo período do ano anterior.
Os Estados com maior incidência de casos são Califórnia, Texas, Illinois e Flórida. Juntos, somam 150 reclamações.



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