São Paulo, domingo, 19 de maio de 2002

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Democracia na ilha dá sinais de fragilidade

DA REPORTAGEM LOCAL

A pobreza é apenas uma das ameaças à nascente democracia timorense. A pacificação completa do território ainda é uma miragem, e a reconciliação após décadas de agressão mal começou.
Virtualmente nenhum dos implicados nos assassinatos de timorenses nos 15 dias que sucederam ao plebiscito de independência, em setembro de 1999, foi a julgamento.
Não há consenso sobre quantos morreram na ocasião. Estimativas variam de cem a mil pessoas. Mais 200 mil, de uma população total de 800 mil, cruzaram a fronteira em direção à parte indonésia da ilha. Com o ambiente de relativa tranquilidade, a maioria retornou, mas cerca de 50 mil permanecem exilados.
Apesar de alguns personagens secundários terem sido levados a julgamento em Timor, os grandes envolvidos permanecem impunes na Indonésia. Entre eles, o general Wiranto, que chefiava as Forças Armadas indonésias na época, e o maior líder das milícias integracionistas, Eurico Guterres.
Recentemente, também surgiu preocupação de um front inesperado. Um grupo de veteranos da Falintil, a guerrilha que liderou a resistência timorense, recusou-se a se integrar ao novo Exército do país, como prevê a Constituição. Reivindicam o direito de permanecer como milícia.
Foi necessária a intervenção pessoal do presidente eleito, Xanana Gusmão, ex-líder da Falintil, para contornar o problema. Mas a incerteza persiste.
O sistema político do novo país também passou por sobressaltos recentemente, o que contribuiu para aumentar as dúvidas. O regime é parlamentarista, mas com presidente forte.
Xanana, notório pela teimosia, será obrigado a conviver com outra personalidade forte, a do primeiro-ministro Mari Alkatiri, cujo papel na resistência à Indonésia é igualmente histórico.
Ex-amigos íntimos, os dois agora são rivais. A ponto de Alkatiri ter feito questão de declarar publicamente que votou em branco, e não em Xanana, na eleição de 14 de abril em que o atual presidente teve mais de 80% dos sufrágios.
Na semana passada, mais turbulência. O líder da União Democrática Timorense, partido mais antigo da ilha, João Carrascalão, renunciou a seu mandato no Parlamento, exigindo que uma nova eleição seja feita, agora que o país é independente.
A sugestão, com ampla repercussão na sociedade timorense, não deve ser acatada pelas autoridades, mas tem o potencial de colocar em xeque a legitimidade do sistema político. (FZ)

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