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HAITI
Para comandante brasileiro, será difícil diferenciar uns de outros; manifestante morre em novo dia de violentos protestos
Rebelde se mistura a "famintos", diz militar
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
Em mais um dia de protestos
violentos no país caribenho, o comandante do Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais Haiti,
capitão-de-mar-e-guerra Marco
Antonio Nepomuceno da Costa,
disse ontem que a principal dificuldade dos militares brasileiros
no Haiti será diferenciar o "faminto, o desesperado" do rebelde. Isso porque, segundo ele, os
rebeldes estão infiltrados na população.
Milhares de manifestantes enfrentaram ontem a tropa de choque em Porto Príncipe para exigir
a volta do ex-presidente Jean-Bertrand Aristide. O manifestante Titus Simpton, 23, foi baleado e
morreu. Não se sabe de onde partiu o disparo.
Em Gonaives, o presidente da
Frente de Reconstrução Nacional
(FRN), Buteur Metayer, exigiu,
em discurso para mil pessoas, a
saída das tropas francesas do país.
"Abaixo a ocupação francesa,
abaixo a França, que se vão os
brancos!", disse Metayer, um dos
rebeldes que lideraram o levante
contra o ex-presidente.
Aristide, que está na Jamaica,
acusa Washington de forçá-lo a
renunciar no dia 29 de fevereiro,
quando seu governo enfrentava
violentos protestos. Os Estados
Unidos negam.
Costa vem, desde o fim de fevereiro, estudando as condições sociais, econômicas, políticas e militares do Haiti, os hábitos da população e suas manifestações religiosas e culturais.
No próximo dia 31, ele deverá
viajar para a ilha do Caribe, onde
comandará o grupamento, criado
pelo governo brasileiro para atuar
na missão de paz da ONU (Organização das Nações Unidas) -o
nome oficial é Missão das Nações
Unidas de Estabilização no Haiti.
"É um país muito pobre, talvez
o mais pobre das Américas. Vamos conviver com pessoas famintas, uma população extremamente necessitada. Os rebeldes estão
entre eles", afirmou ele à Folha
em seu gabinete, no Comando da
Tropa de Desembarque da Força
de Fuzileiros da Esquadra da Marinha, no município de Duque de
Caxias (região metropolitana do
Estado do Rio).
Na avaliação do comandante, as
dificuldades serão sentidas logo
no início da atuação brasileira em
território haitiano. Ele previu problemas na identificação de quem
está com o comportamento alterado por causa da miséria e da fome e de quem está agindo indevidamente por integrar as forças rebeldes do país.
"O pretenso inimigo é difuso,
escondido em meio à população",
disse Costa, 50, já avisado de que
poderá ficar até um ano no Haiti,
pois há a possibilidade de prorrogação do prazo da missão, de seis
meses.
A crise no Haiti, que vem desde
as eleições de 2000, supostamente
fraudadas, se acirrou no início
deste ano, quando os rebeldes,
parte deles antigos aliados de
Aristide, avançaram contra Porto
Príncipe, capital do país. Aristide,
pressionado, acabou deixando o
país.
Os estudos sobre a situação haitiana levaram o capitão-de-mar-e-guerra a esboçar o perfil do rebelde local.
"Ele é originário das camadas
mais pobres da população. Há
também ex-militares, que tornaram-se rebeldes a partir da dissolução das Forças Armadas do
Haiti, há cerca de dez anos."
Costa comandará um grupo de
230 fuzileiros navais (22 oficiais,
65 suboficiais e sargentos e 143 cabos e soldados) recrutados pela
Marinha em sete batalhões e bases no Estado do Rio. Haverá ainda 890 militares do Exército.
O oficial previu que haverá dificuldades por causa do idioma. As
línguas oficiais do Haiti são o
francês e o francês crioulo. Os fuzileiros receberão um dicionário
com palavras portuguesas traduzidas em francês crioulo e inglês.
Quase metade dos soldados que
vão compor a próxima força de
paz são sul-americanos. De acordo com o ministro da Defesa, José
Viegas, é a primeira vez que um
contingente de soldados da região
representa quase 50% de uma força de paz da ONU.
A missão terá duração inicial de
seis meses, mas poderá ser renovada. O objetivo é a manutenção
da paz, mas os soldados poderão
desarmar grupos rivais.
Com agências internacionais
Colaborou Cláudia Dianni, de Buenos
Aires
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