São Paulo, Domingo, 19 de Setembro de 1999
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RELIGIÃO
Líderes das duas igrejas vêem na reconciliação crítica a "teologia da prosperidade" de neopentecostais
Acordo visa combater "mercantilismo"

da Reportagem Local

Lideranças religiosas do Brasil interpretam o acordo entre católicos e luteranos como uma crítica à lógica mercantilista dos grupos neopentecostais -ramo do protestantismo que vem tirando fiéis das igrejas cristãs mais tradicionais e que propaga a "teologia da prosperidade".
Tal doutrina incentiva o devoto a dar dinheiro "para Deus" e a cumprir determinados desafios na esperança de, em troca, receber recompensas materiais.
Leia, abaixo, algumas opiniões colhidas pela Folha:
Dom Cláudio Hummes, 65, arcebispo de São Paulo - "Com o acordo, católicos e luteranos revêem a maneira como encararam o tema da salvação e fazem importante autocrítica. Concluem que os cristãos devem praticar boas obras não para coagir Deus, mas para louvá-lo. Lançam, por outro lado, uma crítica às manifestações religiosas que ainda hoje se baseiam na troca e que induzem o fiel a cumprir certas tarefas com a intenção de alcançar a prosperidade."
Walter Altmann, 55, primeiro vice-presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) - "O consenso se dá justamente quando crescem no mundo denominações religiosas que impõem pesadas cargas a seus devotos. O documento que será assinado na Alemanha vai questionar essas práticas. Vai, também, reafirmar que o ser humano vale pelo que é, e não pelo que produz ou possui. Estabelecerá um princípio radical de igualdade, em contraste com um sistema sócio-econômico que exacerba a competição."
Padre José Bizon, 45, vice-reitor do Seminário Teológico da Arquidiocese de São Paulo - "O documento faz cair por terra a noção de mercado religioso, em que os fiéis realizam algo para obter uma recompensa ."
Rolf Schünemann, 45, pastor sinodal da IECLB - "As sociedades de hoje vendem a idéia de que todos os que estão excluídos do processo produtivo fracassaram na vida. O acordo se opõe a lógica tão cruel e reitera que a dignidade humana advém unicamente de Deus, da misericórdia divina."
Dom Ivo Lorscheiter, 71, bispo de Santa Maria (RS) - "A assinatura da declaração conjunta é, talvez, o principal fruto do ecumenismo -o movimento de diálogo e cooperação entre cristãos."
Gottfried Brakemeier, 62, ex-membro da Comissão Mista Internacional Católico-Luterana - "Apesar de negar que os atos levam o ser humano à salvação, o acordo também enfatiza a necessidade do serviço altruístico como expressão da fé em Deus."
Dom Paulo Evaristo Arns, 78, arcebispo emérito de São Paulo - "Impressiona-me o fato de a declaração conseguir preservar a riqueza tanto da visão luterana quanto da católica e, mesmo assim, atingir o consenso."
Antônio Flávio Pierucci, 52, professor da Universidade de São Paulo, especialista em sociologia da religião - "O acordo faz prevalecer a interpretação luterana de que as atitudes dos homens não influenciam Deus. Rejeita, assim, a religiosidade de resultados imediatos, muito presente nas novas igrejas cristãs, e valoriza uma religião mais ética." (ARMANDO ANTENORE)


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