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São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 2003

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ARGENTINA

À Folha, o prefeito de Buenos Aires diz não considerar que a adesão do presidente tenha decidido sua vitória

Reeleito, Ibarra minimiza apoio de Kirchner

ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES

Aníbal Ibarra, 45, reeleito prefeito de Buenos Aires no último domingo, não acredita que tenha vencido devido ao voto que recebeu do presidente Néstor Kirchner. "Acho que as pessoas reconheceram o nosso trabalho de anos. Kirchner nos apoiou por isso", afirmou Ibarra, em entrevista à Folha.
O prefeito, que disputou a eleição por uma coligação de centro-esquerda, bateu nas urnas o presidente do Boca Juniors, Maurício Macri, obtendo 53,5% dos votos no segundo turno. Macri atraiu para sua candidatura a ala conservadora do Partido Justicialista, de Kirchner.
A capital federal é o motor econômico da Argentina, e a importância política do seu prefeito supera a de todos os governadores, razão pela qual a vitória de Ibarra era importante para Kirchner.
Ibarra acredita que a Argentina tenha começado a viver uma nova fase, apesar de os partidos estarem todos "de pernas para o ar".
O prefeito da cidade mais populosa da Argentina tem uma foto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no seu gabinete. "A foto sempre esteve aí. Não a coloquei só porque você vinha", disse durante a entrevista, na Prefeitura de Buenos Aires.
O encontro foi no final do ano passado, durante visita de Lula, então presidente eleito, à Argentina. "Acompanhei o PT desde a fundação e tenho grande respeito e admiração por Lula." Amanhã, Ibarra estará em São Paulo para o casamento da prefeita Marta Suplicy. "Desejo sorte aos dois [Marta e Luis Favre]. É uma decisão importante a de se casar. Acho que é mais fácil se reeleger prefeito do que manter um casamento." Ibarra é divorciado e tem dois filhos, Santiago, 14, e Pablo, 12.
 
Acompanhei o PT desde a fundação e tenho grande respeito e admiração por Lula

A oposição não passa necessariamente por partidos da oposição. Está tudo de pernas para o ar

Folha - Qual foi a importância do apoio de Kirchner na sua campanha?
Aníbal Ibarra -
É preciso ver com calma. Tínhamos um projeto que foi apoiado por Kirchner. Criamos um programa que não teve como origem de referência o peronismo nem o radicalismo [referência à União Cívica Radical], mas que ambos poderiam participar, além de outras forças políticas ou os setores sindicais. O importante é que, no meio da campanha, as pessoas puderam conhecer todas as coisas que havíamos feito.

Folha - E qual é a importância da parceria com Kirchner?
Ibarra -
São dois pontos: político e de resultados. Político porque queremos consolidar mudanças no país. O outro é o simples fato de que desenvolvimento é bom para todos. E essa harmonia favorece principalmente o cidadão comum.

Folha - Na sua opinião, qual é o futuro da Argentina?
Ibarra -
Existe outra Argentina. Há alguma recuperação econômica, melhora na arrecadação, chegou-se a um acordo com o FMI. Houve uma mudança institucional no país. Politicamente, a Argentina vive uma nova fase. Passamos momentos muito difíceis. Às vezes parece que nos esquecemos, mas foi dramático. Podemos falar até de conflito generalizado civil. Hoje, após as eleições, temos um presidente respaldado pelo voto, que tem uma visão racional da Argentina, que mostrou firmeza nas negociações com o FMI e que não teme confrontar interesses econômicos. Entramos na fase em que as pessoas voltaram a pensar a política como uma forma útil de melhorar as suas vidas.

Folha - O sr. pensa em ser presidente?
Ibarra -
Não. Pensar nisso seria suicida, além de falta de respeito com as pessoas que desejam sorte a este governo.

Folha - A lua-de-mel de Kirchner é criticada por alguns analistas. Alguns temem que o governo fique sem oposição, adote uma atitude hegemônica, o que não seria bom para o país. O que o sr. pensa disso?
Ibarra -
A oposição não passa necessariamente pelos partidos da oposição. Há setores no radicalismo [UCR] que apóiam Kirchner e setores do peronismo que não. Os partidos não se unificam, se dividem. Está tudo de pernas para o ar.

Folha - O sr. acredita que haja uma ruptura no peronismo?
Ibarra -
Não. Hoje as duas referências dentro do peronismo são Kirchner e [o ex-presidente Eduardo] Duhalde e os dois trabalham juntos.

Folha - E o menemismo?
Ibarra -
Acabou. Menem e o menemismo morreram.

Folha - E a relação com o Brasil, com Lula?
Ibarra -
O Brasil é um país que admiro muito, apesar de a Argentina ainda ser melhor no futebol [risos]. O Brasil é um país imenso, com cidades muito complexas e difíceis de administrar, como São Paulo ou Rio de Janeiro. A economia já vinha de situação difícil antes da posse de Lula. Por isso, ele teve de tomar medidas para sanear a economia. Agora, acredito que o país entre num processo de recuperação.

Folha - E a relação com a Argentina? Existem diferenças entre Lula e Kirchner?
Ibarra -
Creio que não devamos superdimensionar as coisas. Todas as vezes em que estive com Kirchner, ele sempre falou de Lula com carinho e da importância que ele tem para a região.
Não se podem comparar os países, tampouco um presidente com o outro ou um estilo com o outro. Cada um está no seu país, levando adiante os compromissos que assumiram em campanha e acho que ambos vão ter êxito nisso.


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