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ARGENTINA
À Folha, o prefeito de Buenos Aires diz não considerar que a adesão do presidente tenha decidido sua vitória
Reeleito, Ibarra minimiza apoio de Kirchner
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
Aníbal Ibarra, 45, reeleito prefeito de Buenos Aires no último
domingo, não acredita que tenha
vencido devido ao voto que recebeu do presidente Néstor Kirchner. "Acho que as pessoas reconheceram o nosso trabalho de
anos. Kirchner nos apoiou por isso", afirmou Ibarra, em entrevista
à Folha.
O prefeito, que disputou a eleição por uma coligação de centro-esquerda, bateu nas urnas o presidente do Boca Juniors, Maurício
Macri, obtendo 53,5% dos votos
no segundo turno. Macri atraiu
para sua candidatura a ala conservadora do Partido Justicialista, de
Kirchner.
A capital federal é o motor econômico da Argentina, e a importância política do seu prefeito supera a de todos os governadores,
razão pela qual a vitória de Ibarra
era importante para Kirchner.
Ibarra acredita que a Argentina
tenha começado a viver uma nova
fase, apesar de os partidos estarem todos "de pernas para o ar".
O prefeito da cidade mais populosa da Argentina tem uma foto
com o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva no seu gabinete. "A foto
sempre esteve aí. Não a coloquei
só porque você vinha", disse durante a entrevista, na Prefeitura de
Buenos Aires.
O encontro foi no final do ano
passado, durante visita de Lula,
então presidente eleito, à Argentina. "Acompanhei o PT desde a
fundação e tenho grande respeito
e admiração por Lula." Amanhã,
Ibarra estará em São Paulo para o
casamento da prefeita Marta Suplicy. "Desejo sorte
aos dois [Marta e
Luis Favre]. É uma
decisão importante
a de se casar. Acho
que é mais fácil se
reeleger prefeito do
que manter um casamento." Ibarra é
divorciado e tem
dois filhos, Santiago, 14, e Pablo, 12.
Acompanhei o
PT desde a
fundação e
tenho grande
respeito e admiração por Lula
A oposição não
passa necessariamente por
partidos da
oposição. Está
tudo de pernas
para o ar
Folha - Qual foi a
importância do
apoio de Kirchner na
sua campanha?
Aníbal Ibarra - É preciso ver com
calma. Tínhamos um projeto que
foi apoiado por Kirchner. Criamos um programa que não teve
como origem de referência o peronismo nem o radicalismo [referência à União Cívica Radical],
mas que ambos poderiam participar,
além de outras forças políticas ou os
setores sindicais. O
importante é que,
no meio da campanha, as pessoas puderam conhecer todas as coisas que
havíamos feito.
Folha - E qual é a
importância da parceria com Kirchner?
Ibarra - São dois
pontos: político e de
resultados. Político
porque queremos
consolidar mudanças no país. O
outro é o simples fato de que desenvolvimento é bom para todos.
E essa harmonia favorece principalmente o cidadão comum.
Folha - Na sua opinião, qual é o
futuro da Argentina?
Ibarra - Existe
outra Argentina.
Há alguma recuperação econômica, melhora na arrecadação, chegou-se a um acordo com o FMI.
Houve uma mudança institucional no país. Politicamente, a Argentina vive uma nova
fase. Passamos
momentos muito
difíceis. Às vezes
parece que nos esquecemos, mas foi
dramático. Podemos falar até de
conflito generalizado civil. Hoje,
após as eleições, temos um presidente respaldado pelo voto, que
tem uma visão racional da Argentina, que mostrou firmeza nas negociações com o FMI e que não
teme confrontar interesses econômicos. Entramos na fase em que as pessoas
voltaram a pensar a
política como uma
forma útil de melhorar as suas vidas.
Folha - O sr. pensa
em ser presidente?
Ibarra - Não. Pensar nisso seria suicida, além de falta de
respeito com as pessoas que desejam
sorte a este governo.
Folha - A lua-de-mel
de Kirchner é criticada por alguns analistas. Alguns temem que o governo fique sem oposição, adote uma atitude hegemônica, o que não seria bom para o
país. O que o sr. pensa disso?
Ibarra - A oposição não passa
necessariamente pelos partidos
da oposição. Há setores no radicalismo [UCR] que apóiam
Kirchner e setores do peronismo
que não. Os partidos não se unificam, se dividem. Está tudo de pernas para o ar.
Folha - O sr. acredita que haja
uma ruptura no peronismo?
Ibarra - Não. Hoje as duas referências dentro do peronismo são
Kirchner e [o ex-presidente
Eduardo] Duhalde e os dois trabalham juntos.
Folha - E o menemismo?
Ibarra - Acabou. Menem e o menemismo morreram.
Folha - E a relação com o Brasil,
com Lula?
Ibarra - O Brasil é um país que
admiro muito, apesar de a Argentina ainda ser melhor no futebol
[risos]. O Brasil é um país imenso,
com cidades muito complexas e
difíceis de administrar, como São
Paulo ou Rio de Janeiro. A economia já vinha de situação difícil antes da posse de Lula. Por isso, ele
teve de tomar medidas para sanear a economia. Agora, acredito
que o país entre num processo de
recuperação.
Folha - E a relação com a Argentina? Existem diferenças entre Lula e
Kirchner?
Ibarra - Creio que não devamos
superdimensionar as coisas. Todas as vezes em que estive com
Kirchner, ele sempre falou de Lula
com carinho e da importância
que ele tem para a região.
Não se podem comparar os países, tampouco um presidente
com o outro ou um estilo com o
outro. Cada um está no seu país,
levando adiante os compromissos que assumiram em campanha
e acho que ambos vão ter êxito
nisso.
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