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Alemanha e Japão querem recuperar poderio militar após 60 anos
Agressores da Segunda Guerra se rearmaram e líderes querem maior papel para tropas; terrorismo e ameaça nuclear de Coréia do Norte são principais razões
STEPHEN FIDLER
DO "FINANCIAL TIMES"
Mais de 60 anos após sua
derrota na Segunda Guerra
Mundial, Japão e Alemanha
parecem estar finalmente deixando para trás um dos legados
duradouros do conflito. Sinais
públicos enviados nas últimas
semanas pelos líderes de Tóquio e de Berlim sugerem que
os dois países estão chegando
mais perto de desenvolver forças militares capazes de refletir
sua influência econômica.
No Japão, o novo primeiro-ministro se viu confrontado
com um novo desafio de segurança, e praticamente à porta
de seu país: a Coréia do Norte já
demonstrou formalmente que
tem condições de detonar uma
arma nuclear.
O teste nuclear do mês passado intensificou a discussão sobre se o Japão deveria desenvolver sua bomba nuclear própria. Em entrevista ao "Financial Times", Shinzo Abe disse
que vai lutar por uma emenda
no artigo da Constituição que
impede o Japão de desenvolver
suas Forças Armadas.
Enquanto isso, na Alemanha,
o gabinete da chanceler Angela
Merkel ratificou um documento governamental aprovando a
ampliação do papel internacional das Forças Armadas nacionais. O documento apontou para as mudanças radicais advindas no ambiente de segurança
do país, tais como o crescimento do terrorismo e a difusão de
armas de destruição em massa.
Ela disse que uma força militar
eficaz "é vital para a segurança
da Alemanha e para uma política de defesa que procura moldar seu ambiente ativamente".
Os fatos podem causar inquietação, em vista da destruição provocada no século 20 pelas agressivas tradições militares dos dois países. Mas, enquanto a China e outros países
da região irão observar o Japão
de perto, os vizinhos da Alemanha provavelmente verão a novidade com bons olhos. E o
mesmo se aplica aos EUA, que
quer que os dois países assumam uma parte maior do ônus
da segurança global, da qual os
americanos consideram que
carregam uma parcela desproporcional.
Os paralelos históricos são
inconfundíveis. Tanto o Japão
quanto a Alemanha têm Constituições redigidas pelos EUA
ou sob forte influência dos EUA
-que impuseram leis básicas
que procuraram jogar por terra
para sempre as tradições militaristas dos dois países.
Nos dois países, a tradição
antimilitarista é mais do que
uma questão de leis: as lições da
Segunda Guerra foram absorvidas por boa parte da população.
Em contraste com os americanos, japoneses e alemães compartilham um ceticismo profundo quanto à eficácia do poderio militar para resolver disputas internacionais.
Nos dois países, a mudança
estratégica inaugurada pelo final da Guerra Fria foi acompanhada por uma mudança de geração. Shinzo Abe, que assumiu
o poder no Japão em setembro,
e Angela Merkel, que este mês
completa um ano no poder, são
os primeiros líderes de seus
países a terem nascido após o
final da Segunda Guerra.
Vizinhanças diferentes
Mas as diferenças entre eles
são maiores que as semelhanças. A Alemanha integra alianças multinacionais: a União Européia e a Otan. Ela está cercada por países amigáveis e não
tem nenhum adversário evidente. Já o Japão tem como
único baluarte contra vizinhos
hostis ou desconfiados a aliança que mantém com os EUA.
"São casos totalmente diferentes", diz Volker Ruehe, ministro da Defesa alemão entre
1992 e 1998. Durante a Guerra
Fria, em contraste com o Japão, a Alemanha pôde mobilizar grande número de tropas
em pouco tempo: uma força de
13 milhões de homens podia ser
mobilizada em sete dias.
Países vizinhos como Dinamarca e Holanda vêm exortando a Alemanha a aumentar seu
orçamento militar, coisa que os
vizinhos do Japão dificilmente
fariam. Ademais, depois de ter
enviado suas primeiras tropas
ao exterior para missão da
ONU no Camboja, desde então
ela já as enviou para muitas outras operações do tipo.
Mas o teste nuclear norte-coreano acrescentou urgência à
discussão no Japão. O maior
obstáculo ostensivo a uma posição militar mais assertiva tem
sido o artigo 9 de sua "Constituição de paz" de 1947. O artigo
reza que "o povo japonês renuncia para sempre à guerra
como direito soberano da nação e à ameaça ou uso da guerra
como maneira de resolver disputas internacionais".
Comenta-se que a dissolução
das inibições decorrentes da
Segunda Guerra seria sinal de
que Japão e Alemanha estariam se tornando países mais
normais. Mas tudo indica que o
caminho à "normalidade" plena terá muitos obstáculos.
Tradução de CLARA ALLAIN
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